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25/10/2006 - 09h46

Ming-liang abre foco político em "Eu Não Quero Dormir Sozinho"

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CÁSSIO STARLING CARLOS
da Folha de S.Paulo

Os freqüentadores da 30ª Mostra de SP já devem estar acostumados com as produções de Tsai Ming-liang, diretor malaio cujos filmes, desde os primeiros, entraram pela porta do festival. Para quem desconhece seu trabalho vale um aviso: vá preparado.

Na medida em que avança, sua obra aprofunda a rarefação dramática e muitos espectadores podem odiar seu estilo. "Eu Não Quero Dormir Sozinho", seu filme mais recente, é mais um passo na desconstrução de qualquer traço de trama.

O que interessa a Ming-liang, além de suas tradicionais obsessões --fluxos de água, doenças infecciosas, mutismo e sexo não-tradicional, além de uma narrativa pontuada por canções--, é a criação de uma atmosfera sensorial e simbólica.

Por meio dela, o diretor traça sua visão de um mundo onde abandono e solidão foram impostos como lei. E transmite essa concepção ao espectador não por meio de uma trama ou de um discurso, mas através de uma duração lenta, quase estagnada, mas, sobretudo, hipnótica. Pois o que lhe interessa revelar ou nos elevar é o tempo, sob a forma da duração, fazendo-nos sentir os ritmos e as mais ligeiras alterações.

Retomando a colaboração com seu ator-fetiche, Lee Kang-sheng, que interpreta dois personagens --um paciente em coma e um mendigo--, o cineasta captura os sinais mínimos da passagem do tempo na contemplação dos corpos, submetidos a uma quase paralisia.

É através desses corpos que o diretor renova sua abordagem, com um interesse pelos vínculos humanos, aqui construídos de um modo estritamente físico, depois que a palavra, em seu universo, foi abolida como signo possível de interação.

A pequena variação aparente de seus motivos fundamentais poderia provocar a impressão de pouca novidade do filme.

Mas o deslocamento da situação para Kuala Lumpur, cidade de origem do diretor, que até então só filmara em Taiwan, abre um foco diferencial.

A solidão e o abandono deixam de ser só existenciais e ganham tonalidades políticas, com a entrada em cena de imigrantes clandestinos e, sobretudo, na ambientação.

Um dos cenários recorrentes é um prédio abandonado, com arquitetura imponente, signo duplo e forte do boom econômico da Malásia nos anos 90 e da crise econômica que se seguiu. Em seu interior, uma bacia de água acumulada, que retorna como o símbolo ambíguo de outros trabalhos do diretor: ao mesmo tempo, fluxo e estagnação.

Confinado em três espaços cênicos, "Eu Não Quero Dormir Sozinho" se apropria da materialidade (corpos, líquidos e fumaça) para traduzir as sensações de rarefação e de saturação, de sufocamento e de liberação. Mas é a abertura para o tema do cuidado que liberta o cinema de Ming-liang do círculo vicioso da solidão.

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