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26/10/2002 - 01h30

Games, o atirador de Washington e a hipocrisia democrática

FRANCISCO MADUREIRA
Editor de Informática da Folha Online

A tela do computador assume ser sua visão do cenário. De você, só há na tela a mão, que segura um revólver, uma metralhadora, um rifle ou mesmo uma granada. A missão é atirar nos inimigos, sejam eles policiais ou bandidos. Esses são os jogos de tiroteio em primeira pessoa, que ganharam extrema popularidade há alguns meses.

Nessas semanas, por uma engrenagem defeituosa da sociedade ocidental, eles voltaram à tona. Isso porque um louco (será que Freud virou no túmulo agora?) decidiu sair às ruas de Washington com um rifle na mão, atirando em gente inocente e aterrorizando as pessoas.

Como a engrenagem com defeito se aproximou demais do núcleo gerador de poder do nosso glorioso motor social, os engenheiros projetistas logo tiveram de tentar resolver o problema. Ontem, uma grande cadeia de lojas dos Estados Unidos retirou de suas prateleiras um jogo de tiroteio em primeira pessoa.

O engraçado é que, nesta mesma semana, o popular buscador Google sutilmente tirou de seu sistema sites que, segundo seu julgamento, tinham conteúdo contrário ao judaismo ou favoráveis ao nazismo.

A liberdade parece ser a bandeira do sistema de valores pregado pela matriz norte-americana. E essa mesma liberdade, quando elevada à categoria de liberdade de expressão, é tida como um dos alicerces da democracia.

Ora, de duas, uma. Ou a liberdade de expressão existe e as chamadas minorias podem se expressar, ou então nossa democracia não é bem uma democracia.

Uma visão mais radical, coisa que eu escreveria aqui há algum tempo, poderia simplificar o assunto --inclusive para obter um texto de maior impacto e atrair leitores ávidos por consumir um produto fechado. Eu poderia dizer que a proibição do jogo de tiroteio em Washington faz sentido, porque esse tipo de entretenimento estimula a violência e, se não criou a figura do atirador de Washington, pode estimular crianças e jovens a esse tipo de comportamento no futuro. Mas, amigo leitor, eu seria superficial.

Democracia é algo complexo. Embora vivamos por enquanto num teatro social, uma "democracia hipócrita" cujo palco para os protagonistas do poder é esta própria mídia, esse sistema deve amadurecer com o tempo. E uma democracia madura, imagino eu, não proibiria, mas, em vez disso, educaria.

No dia em que não houver mais compradores de violência na sociedade, não será mais preciso proibir um jogo de tiroteio ou banir o nazismo. Essas expressões simplesmente inexistirão. A preocupação será outra.

(Veja que, embora eu possa querer ser progressista com essa idéia, posso estar sendo absurdamente conservador. Isso porque pensar numa sociedade que se auto-regula é idolatrar o liberalismo, um liberalismo levado a sério.)

Mas isso, leitor ávido, não se faz numa geração, nem em duas. Isso leva tempo. Coisa que perdemos. As engrenagens simplesmente não podem parar.

Mas, até aí, isso também não se resolve numa coluna de fim de semana. Bah! :-)

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