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23/02/2003
-
10h00
ANDRÉ SOLIANI
da Folha de S.Paulo, em Brasília
Apesar de o Brasil relutar em reconhecer as Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia) como grupo terrorista, o chanceler Celso Amorim admitiu que há preocupação com a possibilidade de a guerrilha ultrapassar as fronteiras e usar o território brasileiro como refúgio.
"Evidentemente, é uma preocupação. E, se houver indicação de atividade terrorista em território nacional, vamos ter de agir", disse Amorim na sexta-feira à Folha, logo após receber a primeira carta formal do governo da Colômbia pedindo o reconhecimento das Farc como "grupo terrorista".
A mesma carta foi encaminhada aos outros países que fazem fronteira com a Colômbia: Venezuela, Peru e Equador. Quem a assina é o presidente Álvaro Uribe.
Amorim deixou claro que não há no Brasil uma catalogação de grupos terroristas e disse que segue a OEA (Organização dos Estados Americanos). Por iniciativa da própria Colômbia, a OEA citou pela primeira vez as Farc como responsável por atentados terroristas. Na sutil linguagem diplomática, é diferente de dizer que se trata de um grupo terrorista.
A sutileza se explica, apesar de o chanceler ter se negado a entrar em detalhes. É que classificar de terrorista poderia justificar a intensificação de ações militares americanas na Colômbia. Atualmente, tropas dos EUA já colaboram com o governo de Uribe dentro do Plano Colômbia, mas sob o pretexto de acabar com o narcotráfico, não explicitamente com o terrorismo.
Com o possível acirramento da tensão colombiana, especialmente depois de um atentado que matou civis no início do mês, o temor do Brasil é que o conflito se "expanda" aos países vizinhos.
Venezuela
A crise da Colômbia preocupa ainda mais o Itamaraty e o Planalto porque os dois países fazem fronteira com um outro vizinho problemático: a Venezuela, que acaba de sair de 63 dias de greve.
Conforme a Folha apurou, o Brasil considera que a melhor solução para o conflito venezuelano é um referendo popular com base na Constituição.
Amorim, porém, se negou a comentar eventuais soluções internas. Disse apenas que o Brasil e o Grupo de Amigos da Venezuela consideram necessário "o estabelecimento de um clima de confiança mútua entre o governo Hugo Chávez e a oposição". Isso, disse, é fundamental para preservar o resultado de qualquer acordo.
Em recente encontro em Brasília com o chanceler da Venezuela, Roy Chaderton, Amorim fez algumas sugestões para serem colocadas na mesa de negociações entre Chávez e os líderes oposicionistas.
Uma delas é a presença de monitores internacionais caso venha a ser realizado um referendo para agosto, o que é, aparentemente, o mais provável. Esse referendo seria sobre a permanência ou não de Chávez no poder.
O encontro dos dois chanceleres foi antes do mais novo lance da crise: a prisão de um dos líderes de oposição, Carlos Fernández, da Fedecámaras, principal entidade empresarial do país. A decisão foi interpretada como ato político, que acirra os ânimos em vez de abrir negociações.
Mais uma vez, Amorim foi cauteloso ao comentar o episódio: "Foi uma decisão judicial, e há que se partir do princípio de que o Judiciário é independente. O momento é de procurar distender".
A frase certamente vai agradar ao embaixador da Venezuela no Brasil, Vladimir Villegas, que reclamava das versões que circulavam em Brasília contra as prisões. Segundo ele, "foi uma decisão judicial, porque o empresário foi citado pelo Ministério Público e se recusou a comparecer; ele foi preso dentro da lei".
Iraque
Além das crises vizinhas, o Brasil se engajou na luta de países grandes, como Rússia, Alemanha e França, contra um ataque imediato dos EUA ao Iraque.
Na última reunião do presidente Luiz Inácio Lula da Silva com seus ministros, Amorim disse que a guerra "é possível", mas deixou alguns dos colegas perplexos ao ressalvar que "não é inevitável".
Na sexta-feira, voltou a repetir para a Folha: "Existe, sim, a hipótese de não haver guerra". Lembrou que "muita coisa, além da própria economia, está em jogo", como o prestígio da ONU e de seu Conselho de Segurança.
Quanto aos sinais de fragilidade da economia americana, comparou: "Em muitos momentos, uma guerra pode ter sido solução para crises recessivas. Com certeza, não é o caso agora".
Recém-chegado de uma viagem a Moscou e Berlim, onde discutiu a possibilidade da guerra, Amorim disse que o Brasil ganhou importância no novo cenário mundial: "Não podemos superestimar, mas também não devemos subestimar. Você não marca trivialmente encontros com russos e alemães se eles não tiverem interesse na posição brasileira".
Ainda segundo o chanceler, "o Brasil é um país em desenvolvimento que simboliza a posição de muitos outros".
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Brasil teme se tornar refúgio das Farc
ELIANE CANTANHÊDEANDRÉ SOLIANI
da Folha de S.Paulo, em Brasília
Apesar de o Brasil relutar em reconhecer as Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia) como grupo terrorista, o chanceler Celso Amorim admitiu que há preocupação com a possibilidade de a guerrilha ultrapassar as fronteiras e usar o território brasileiro como refúgio.
"Evidentemente, é uma preocupação. E, se houver indicação de atividade terrorista em território nacional, vamos ter de agir", disse Amorim na sexta-feira à Folha, logo após receber a primeira carta formal do governo da Colômbia pedindo o reconhecimento das Farc como "grupo terrorista".
A mesma carta foi encaminhada aos outros países que fazem fronteira com a Colômbia: Venezuela, Peru e Equador. Quem a assina é o presidente Álvaro Uribe.
Amorim deixou claro que não há no Brasil uma catalogação de grupos terroristas e disse que segue a OEA (Organização dos Estados Americanos). Por iniciativa da própria Colômbia, a OEA citou pela primeira vez as Farc como responsável por atentados terroristas. Na sutil linguagem diplomática, é diferente de dizer que se trata de um grupo terrorista.
A sutileza se explica, apesar de o chanceler ter se negado a entrar em detalhes. É que classificar de terrorista poderia justificar a intensificação de ações militares americanas na Colômbia. Atualmente, tropas dos EUA já colaboram com o governo de Uribe dentro do Plano Colômbia, mas sob o pretexto de acabar com o narcotráfico, não explicitamente com o terrorismo.
Com o possível acirramento da tensão colombiana, especialmente depois de um atentado que matou civis no início do mês, o temor do Brasil é que o conflito se "expanda" aos países vizinhos.
Venezuela
A crise da Colômbia preocupa ainda mais o Itamaraty e o Planalto porque os dois países fazem fronteira com um outro vizinho problemático: a Venezuela, que acaba de sair de 63 dias de greve.
Conforme a Folha apurou, o Brasil considera que a melhor solução para o conflito venezuelano é um referendo popular com base na Constituição.
Amorim, porém, se negou a comentar eventuais soluções internas. Disse apenas que o Brasil e o Grupo de Amigos da Venezuela consideram necessário "o estabelecimento de um clima de confiança mútua entre o governo Hugo Chávez e a oposição". Isso, disse, é fundamental para preservar o resultado de qualquer acordo.
Em recente encontro em Brasília com o chanceler da Venezuela, Roy Chaderton, Amorim fez algumas sugestões para serem colocadas na mesa de negociações entre Chávez e os líderes oposicionistas.
Uma delas é a presença de monitores internacionais caso venha a ser realizado um referendo para agosto, o que é, aparentemente, o mais provável. Esse referendo seria sobre a permanência ou não de Chávez no poder.
O encontro dos dois chanceleres foi antes do mais novo lance da crise: a prisão de um dos líderes de oposição, Carlos Fernández, da Fedecámaras, principal entidade empresarial do país. A decisão foi interpretada como ato político, que acirra os ânimos em vez de abrir negociações.
Mais uma vez, Amorim foi cauteloso ao comentar o episódio: "Foi uma decisão judicial, e há que se partir do princípio de que o Judiciário é independente. O momento é de procurar distender".
A frase certamente vai agradar ao embaixador da Venezuela no Brasil, Vladimir Villegas, que reclamava das versões que circulavam em Brasília contra as prisões. Segundo ele, "foi uma decisão judicial, porque o empresário foi citado pelo Ministério Público e se recusou a comparecer; ele foi preso dentro da lei".
Iraque
Além das crises vizinhas, o Brasil se engajou na luta de países grandes, como Rússia, Alemanha e França, contra um ataque imediato dos EUA ao Iraque.
Na última reunião do presidente Luiz Inácio Lula da Silva com seus ministros, Amorim disse que a guerra "é possível", mas deixou alguns dos colegas perplexos ao ressalvar que "não é inevitável".
Na sexta-feira, voltou a repetir para a Folha: "Existe, sim, a hipótese de não haver guerra". Lembrou que "muita coisa, além da própria economia, está em jogo", como o prestígio da ONU e de seu Conselho de Segurança.
Quanto aos sinais de fragilidade da economia americana, comparou: "Em muitos momentos, uma guerra pode ter sido solução para crises recessivas. Com certeza, não é o caso agora".
Recém-chegado de uma viagem a Moscou e Berlim, onde discutiu a possibilidade da guerra, Amorim disse que o Brasil ganhou importância no novo cenário mundial: "Não podemos superestimar, mas também não devemos subestimar. Você não marca trivialmente encontros com russos e alemães se eles não tiverem interesse na posição brasileira".
Ainda segundo o chanceler, "o Brasil é um país em desenvolvimento que simboliza a posição de muitos outros".
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