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10/08/2003 - 08h08

Sob pressão, Paraguai tenta se "legalizar"

ROGERIO WASSERMANNM
da Folha de S.Paulo

O Paraguai empossa na próxima sexta-feira na Presidência Nicanor Duarte Frutos, 46, que promete tirar do país a conhecida pecha de paraíso da corrupção, da falsificação e do contrabando.

Conta, para isso, com a ajuda do Brasil, que promete empréstimos de mais de US$ 1 bilhão, e com a pressão do Fundo Monetário Internacional (FMI), que vê no combate a esses problemas a única forma de o Paraguai sair da crise econômica e financeira em que se encontra e honrar os compromissos de sua dívida pública, que chegavam a US$ 2,2 bilhões em dezembro do ano passado.

"Vamos promover uma guerra contra a corrupção e a impunidade. Em meu governo não haverá padrinhos nem parentes. Quem não funcionar vai embora", afirmou Duarte anteontem, ao apresentar sua equipe econômica.

Para os analistas paraguaios, o discurso de Duarte é, em parte, decorrente também da pressão dos governos brasileiro e argentino, que vêem no Paraguai um "vizinho problema". Não são poucas as fontes de dor de cabeça para o Brasil originadas no Paraguai. A fronteira do Brasil com o país é a principal porta de entrada para o contrabando de produtos como armas, CDs, roupas, cigarros, peças automotivas e equipamentos eletrônicos, entre outros.

Carros roubados no Brasil frequentemente aparecem depois no Paraguai --estima-se que 70% dos 600 mil veículos que circulam no país estejam em situação irregular. Em 2001, descobriu-se que o carro que o atual presidente, Luis González Macchi, usava, um BMW, havia sido roubado no Brasil. No início deste ano, descobriu-se que a primeira-dama, Susana Galli, também usava um Mercedes roubado no Brasil.

Entre 1989 e 2000, o Paraguai foi o quarto principal destino das armas leves fabricadas no Brasil --muitas das quais voltavam ao país de maneira ilegal. A exportação de armas para o Paraguai foi proibida em 2000, mas o país permanece como principal origem do contrabando para o Brasil.

O Paraguai é também o principal fornecedor da maconha que chega ao Brasil do exterior.

Além de tudo disso, casas de câmbio paraguaias são acusadas de participação no esquema que enviou, por meio do Banestado (Banco do Estado do Paraná), até US$ 30 bilhões ao exterior.

Sinais

"Os sinais recentes são claros. Ou o Paraguai põe a casa em ordem ou o Brasil não vai ajudar muito", afirma o cientista político Tomás Palau, do centro de pesquisas Base, de Assunção.

Para Palau, os empréstimos prometidos pelo Brasil para obras de infra-estrutura, por meio do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), pressupõem a condição de que o Paraguai ataque os problemas que afetam o país.

As supostas pressões dos vizinhos geraram até mesmo uma crise política no governo paraguaio, com a demissão do ministro da Justiça e do Trabalho, José Burró, que chamou brasileiros e argentinos de "bando de sem-vergonhas". A afirmação de Burró havia sido uma resposta a declarações do embaixador brasileiro no Paraguai, Luis Augusto de Castro Neves, sobre a falta de segurança jurídica no país.

O Itamaraty nega a pressão sobre o Paraguai. Diplomaticamente, o chefe da Divisão de América Meridional 1 do Itamaraty, Pedro Fernando Bretas, diz que prefere comentar a "agenda positiva" da relação bilateral.

"O interesse do Brasil é o progresso do Paraguai. Não queremos um Paraguai combalido, em má situação econômica, até porque o Paraguai é um bom mercado para os produtos brasileiros", diz Bretas. "Não é uma questão de o Brasil adotar uma posição paternalista, mas de ajudar um vizinho com generosidade", afirma.

"O conceito que nós temos do Mercosul [formado por Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai] é o de criar uma zona de articulação econômica, não só comercial", afirma o assessor especial da Presidência para assuntos internacionais, Marco Aurélio Garcia.

"Evidentemente que há todo o interesse para o Brasil de que o Paraguai se industrialize, para criar alternativas consistentes para a economia paraguaia, que hoje é somente uma grande exportadora de energia, o que não é bom", diz Garcia. "No que o Brasil puder contribuir para a diversificação econômica do Paraguai, nós contribuiremos, ainda que dentro de nossas limitações."

A diplomacia argentina adota o mesmo discurso e alerta para o fato de que a consolidação do Mercosul pressupõe o reconhecimento de que as economias dos países-membros "têm desenvolvimentos diferentes entre si".

"Compartilhamos com o Brasil a visão de que devemos reconhecer que tanto o Paraguai quanto o Uruguai têm assimetrias em relação a nossos países e, por isso, têm de ter um tratamento diferenciado dentro do Mercosul para que se desenvolvam plenamente", afirmou Eduardo Cigal, subsecretário de Integração Econômica da Chancelaria argentina.

Apesar de não haver hoje prevista nenhuma ajuda econômica da Argentina para o Paraguai, Cigal diz que iniciativas como a do Brasil são importantes dentro desse contexto do Mercosul. "É algo semelhante ao que aconteceu na União Européia", diz, em referência à ajuda econômica que os países menos desenvolvidos receberam para se integrar ao bloco.

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