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10/08/2003 - 08h15

Elite paraguaia pode frustrar moralização

da Folha de S.Paulo

Para cumprir sua promessa de acabar com a corrupção e o contrabando no Paraguai, Nicanor Duarte Frutos terá de enfrentar os interesses econômicos dos grupos que lucram há décadas com a ilegalidade no país, muitos deles estabelecidos dentro da máquina do Partido Colorado, agremiação à qual pertence o próprio presidente eleito e que está no poder ininterruptamente desde 1947.

"A principal questão que se coloca é quanta força política Nicanor Duarte terá para implementar o que está prometendo. Porque, para combater a corrupção e o contrabando, ele terá de enfrentar os interesses econômicos de gente muito poderosa e de grupos políticos muito poderosos", afirma o analista político Tomás Palau, do centro de pesquisas Base, de Assunção.

O setor dos cigarros é considerado emblemático dos problemas que Nicanor Duarte terá de enfrentar para cumprir suas promessas. Existem hoje no Paraguai ao menos 29 fábricas de cigarros --a maioria delas instaladas perto da fronteira com o Brasil. Essas fábricas produzem 87 bilhões de cigarros ao ano, contra um consumo interno estimado em apenas 3 bilhões de cigarros ao ano.

A maior parte dessa produção acaba desviada para os países vizinhos. Anualmente entram no Brasil 46 bilhões de cigarros ilegais provenientes do Paraguai (para um mercado legal de 97 bilhões de cigarros anuais), acarretando em uma perda fiscal estimada em R$ 1,4 bilhão.

A força política dos falsificadores e contrabandistas de cigarros é considerada um dos fatores que impedem a aprovação, pelo Congresso paraguaio, de um convênio de cooperação com o Brasil, assinado em setembro de 2000.

Em troca de incentivos para empresas brasileiras se instalarem no Paraguai, o convênio prevê, entre outras coisas, ações conjuntas de fiscalização contra a falsificação de marcas brasileiras de cigarro no Paraguai.

Figuras importantes

Entre os principais acusados de falsificar e contrabandear cigarros para o Brasil estão figuras importantes dentro do Partido Colorado, como Reinerio Santacruz, candidato derrotado ao governo do Departamento de Alto Paraná (cuja capital é Ciudad del Este), e Oswaldo Domínguez Dibb, conhecido como ODD, presidente do clube de futebol Olímpia.

Domínguez é acusado, entre outras coisas, de falsificar os selos brasileiros de recolhimento de IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados) para os maços de cigarro e de produzir no Paraguai cigarros de marcas registradas brasileiras. Ele nega as acusações.

ODD foi um dos principais apoiadores da candidatura de Duarte à Presidência, após perder para ele a indicação do Partido Colorado à vaga. Um dia após a eleição presidencial, em abril, enquanto Duarte dava uma entrevista à Folha em sua casa, em Assunção, o filho de ODD, Julio Osvaldo Domínguez, eleito senador, o esperava numa sala ao lado com um grupo de congressistas.

Durante essa mesma entrevista, Duarte disse, ao ser questionado sobre sua relação com ODD, que não era "babá de ninguém" e que, "enquanto uma pessoa não estiver condenada, presume-se sua inocência".

"Para a sorte de Nicanor Duarte, Reinerio Santacruz perdeu a eleição para governador, o que lhe permite trabalhar com menos pressão", diz o cientista político José Nicolás Morinigo, senador recém-eleito pelo partido opositor País Solidário (centro-esquerda). "Para realizar uma cirurgia profunda como a que ele promete, Duarte terá de fazê-la nos seus primeiros cem dias de governo, antes que a estrutura da burocracia estatal se acomode", diz.

Para os analistas, as indicações que Duarte vem dando na formação de sua equipe de governo são positivas. Dois postos-chave, como o Ministério da Fazenda e a Direção Nacional de Aduanas, foram dados a pessoas que não pertencem ao Partido Colorado.

Além disso, ele vem buscando apoio dos partidos de oposição para um "governo de união nacional", em parte por não contar com uma maioria própria na Câmara dos Deputados e no Senado.

Na última semana, ele prometeu ainda uma devassa nas Forças Armadas e na Polícia Nacional. "Há setores da Polícia e das Forças Armadas que operam como grupos delinquentes", disse Duarte. "Vamos depurar os quadros [das corporações]", afirmou.

"Se conseguir vencer os obstáculos e cumprir o que está prometendo, Duarte será o primeiro presidente paraguaio a combater efetivamente o contrabando e a corrupção", afirma Palau. "Alfredo Stroessner [ditador entre 1954 e 1989] tinha um certo controle sobre o contrabando, por ser um governo despótico. Os que vieram depois também não combateram o problema, pelo contrário. Foram propiciadores do contrabando e só fizeram aumentar a corrupção."

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