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Direita explora agenda da esquerda no Chile
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THIAGO GUIMARÃES
enviado especial da Folha de S. Paulo a Santiago (Chile)
Em uma campanha sem grandes discussões programáticas, um dos temas que marcaram a atual disputa presidencial no Chile foi a inclusão de minorias sexuais na publicidade de televisão dos quatro candidatos.
Mais do que referências diversas sobre como acolher os homossexuais na sociedade, chamou a atenção a exibição de um casal gay no programa de Sebastián Piñera, o empresário de centro-direita que lidera as pesquisas e ameaça a hegemonia de 20 anos da esquerda moderada no país.
A adoção de um tema estranho à agenda da direita no país revela um dos pontos cruciais da nova estratégia de Piñera, derrotado em 2005 pela presidente Michelle Bachelet: mostrar-se como candidato transversal, com preocupações que ultrapassam o discurso conservador tradicional.
Nesse sentido, já contava a favor de Piñera, empresário mais rico do Chile, dono da empresa aérea LAN, o trabalho pelo "não" no plebiscito de 1988, que propunha mais oito anos de ditadura no país. É um ativo político importante, que define as pessoas no Chile.
De olho na aprovação de quase 80% de Bachelet, Piñera promete -assim como Eduardo Frei, o candidato da Concertação, a coalizão governista- manter a rede de proteção social que é o selo da atual gestão e ampliá-la à classe média.
O apelo à classe média marca as duas principais candidaturas e aponta para um setor decisivo na eleição deste domingo.
"A classe média baixa cresce e é cada vez mais influente. Vai ser chave nesta eleição porque sempre votou mais no centro e na direita. Se Piñera ganhar vai ser, em grande parte, pelo voto da classe média", afirmou à Folha o cientista político Patricio Navia.
O desgaste da Concertação também se explica pelo seu afastamento dessa nova classe média, reconhece o sociólogo Eugenio Tironi, que trabalha para Frei.
"A Concertação está muito encastelada no Estado e perdeu contato com grupos médios emergentes que não tiveram apoio do Estado e veem em Piñera uma pessoa que transpira êxito econômico."
Ruídos na direita
O giro ao centro de Piñera -com aceno a membros da Concertação para integrar seu eventual gabinete- causou ruído na aliança de centro-direita. Setores da UDI, o partido mais conservador da coalizão, questionaram, por exemplo, sua defesa da união civil homossexual --criticada pela Igreja Católica-- e da distribuição da pílula do dia seguinte, também objeto de projeto de lei do governo.
"A oposição tem a complexa tarefa de angariar votos da Concertação para evitar nova derrota, que lhe traria consequências devastadoras. Daí o apelo à continuidade e as propostas liberais contrárias aos valores conservadores que representa", avalia o analista político Carlos Huneeus.
Para Huneeus, ao enfatizar a discussão de valores, Piñera busca ainda evitar que o debate se concentre em seu calcanhar de aquiles: a ligação entre negócios e política. "É um movimento oportuno e inteligente", afirma.
No último debate presidencial, o candidato independente Marco Enríquez-Ominami perguntou a Piñera o que esperava para se afastar de suas empresas --promessa do candidato favorito. "É um processo em boa parte já cumprido, mas faltam pendências", respondeu o empresário.
O historiador Alfredo Jocelyn-Holt, da Universidade do Chile, vê uma "grande jogada de marketing" na guinada à esquerda de Piñera. "É a versão "diet" do candidato".
Pegos no meio da estratégia dos candidatos --a propaganda de Frei exibiu um beijo lésbico e Piñera aparece escutando um casal de homens gays--, entidades de defesa homossexual refletiram o tédio dos chilenos com a política. "São apenas palavras. Procuram obter um espaço na comunidade gay, mas é só pelo momento", disse Franco Del Río, da Afirmação Chile.
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