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11/01/2010 - 08h38

Egito aperta cerco a faixa de Gaza e tensiona divisa

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MARCELO NINIO
enviado especial da Folha de S. Paulo a Rafah (Egito)

Passa um pouco das 5h e uma porta de ferro se abre a poucos metros da divisa do Egito com a faixa de Gaza. Cinco jovens estrangeiros com cara de sono saem enrolados em cobertores de uma das duas vendas do local, um bar sujo cujo cardápio se resume a chá, café, refrigerantes, biscoitos e batata frita.

Vai começar mais um dia de espera em Rafah, a imprevisível fronteira egípcia com o território palestino controlado pelo grupo extremista Hamas. Na virada do ano, duas caravanas de solidariedade com palestinos colocaram a polícia egípcia em alerta, tornando os caminhos e cercanias de Rafah quase proibidos para estrangeiros.

Os cinco que dormiram no bar foram dos raros, entre centenas, que superaram as várias barreiras policiais do Cairo a Rafah e chegaram à divisa, com poucas esperanças de entrar.
"Para nós a virada do ano foi como jogo de gato e rato com a polícia", conta uma universitária italiana, pedindo para não ser identificada. "Policiais chegaram a cercar o nosso hotel no Cairo, para assegurar que não chegaríamos à fronteira", diz.

Cursando o segundo ano de Ciências Políticas, ela foi uma das 1.300 ativistas que foram ao Egito atendendo a chamado do grupo feminino americano Codepink para uma marcha contra o bloqueio à faixa de Gaza.

O plano era todos entrarem em 27 de dezembro, para protestar contra o ataque israelense que começou nesta data, em 2008. Mas não adiantou acampar na frente da embaixada da França nem fazer greve de fome: só 84 entraram, ainda assim por intervenção da primeira-dama, Suzanne Mubarak.

Dor de cabeça

Ao mesmo tempo, o comboio humanitário Viva Palestina, liderado pelo polêmico e midiático deputado britânico George Galloway, tentava entrar em Gaza com mais de cem veículos e US$ 4 milhões em suprimentos. Desde Londres, alguns dos 450 ativistas percorreram quase 8.000 km até chegar a Rafah.

Conforme anunciado, o Egito reabriu a fronteira no dia 3 de janeiro, mas o movimento nos dois sentidos, sob controle redobrado, fluiu a conta-gotas.

Estrangeiros foram mantidos longe, inclusive a imprensa. Apesar de ter obtido permissão do Ministério do Interior para ir a Gaza, a reportagem da Folha foi barrada por "mudanças nas normas de segurança".

Única passagem de Gaza não controlada por Israel, Rafah é uma dor de cabeça para o Egito desde que o Hamas assumiu à força o território, em 2007. Antigo desafeto ideológico, por suas ligações com a oposição islâmica no Egito e o rival Irã, o Hamas se tornou um vizinho extremamente indesejável para o ditador Hosni Mubarak.

E criou um dilema: de um lado, a pressão do mundo islâmico por solidariedade aos palestinos; de outro, preocupações com a segurança de sua fronteira e possíveis infiltrações do Hamas. No meio de tudo, o drama dos residentes e refugiados.

"Por Israel não posso entrar por ser refugiado. E pelo Egito também não, pois não sou considerado palestino", diz Komy, 34, após ser barrado mais uma vez em Rafah. Preparador físico de futebol no Cairo, ele nasceu no Kuait, para onde a sua família fugiu na Guerra de 1948, quando Israel foi fundado.

Em 1990, nova mudança forçada: perseguida pelos soldados iraquianos que invadiram o Kuait, a família migrou para o Egito, de onde Komy tenta há 15 anos entrar em Gaza para reaver as propriedades do pai.

De acordo com a UNRWA, agência especializada da ONU (Organização das Nações Unidas), há cerca de 4 milhões de refugiados palestinos, a maioria nascida nessa condição. Em Rafah, histórias de três gerações no exílio se acumulam.

Após um mês de viagem e uma série de atritos com a polícia, na última quinta o comboio de Galloway recebeu permissão para entrar em Gaza. Horas antes, um policial egípcio fora morto por um atirador no lado palestino em meio a protestos contra o atraso do comboio.

Para evitar novos incidentes, o Cairo decidiu que, a partir de agora, não haverá mais entrega direta de ajuda aos palestinos por seu território, apenas por meio do Crescente Vermelho.

Mas Galloway, que acabou sendo deportado do Egito, já planeja a quarta versão da caravana em 2011 e promete: virá com o venezuelano Hugo Chávez. "Ele disse que vem como cidadão, não como presidente", diz Komy, repetindo a manchete do noticiário no rádio que acabou de ouvir.

 

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