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  27 de abril
  Do câncer no piloro
   
   
RIO DE JANEIRO - O que revolta no câncer é que ele nasce em silêncio, sem dor e sem grito. Muito gente preferiria que ele doesse logo, botaríamos a boca no mundo e facilitaríamos a precocidade do diagnóstico. Mas o câncer prefere crescer sem espantos. Quando dói já nos tem em suas garras. Como as grandes estações de ônibus, tornamo-nos terminais.
Morte por morte, tanto faz o câncer como a bala perdida - que tanto assusta o Caversan - o desastre aéreo, o insulto cerebral. Aliás, morrer de insulto cerebral é dose. Os insultos exigem o revide. Não deve ser agradável ir para a eternidade deixando um insulto eternamente impune.
Desde os bancos escolares que o câncer me persegue, sob a forma de um trópico que até hoje não sei para que serve nem por onde passa. O que redime o câncer é seu colega de globo terrestre, o de Capricórnio. Ignoro os responsáveis pelos nomes dessas coisas. A opção que o camarada nos legou é dolorosa: câncer ou capricórnio. Queiramos ou não, estamos sob o signo de um deles. E há os exagerados, que estão sob o signo dos dois.
Por falar em exagero, exagero é ter câncer no piloro. O que torna o câncer emocionante é que ele ataca em vários lugares. A tuberculose exasperava pela monotonia, as hemoptises, a febre, a tosse, o tango argentino. O câncer tem mais imaginação, escolhe o lugar adequado para matar. E dá nos mais estranhos territórios.
Não sei se existe o câncer da flora intestinal, mas há o câncer nos gânglios linfáticos. O câncer mais civilizado é o do fígado, todo mundo olha para o camarada e pensa: esse aí aproveitou a vida, bebeu bem, comeu bem, amou bem.
Já o câncer no duodeno, no reto, no baço, são prosaicos. Agora, câncer calhorda é o do piloro.


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