Folha Online sinapse  
16/12/2003 - 03h24

Afogada em letras

HELOÍSA HELVÉCIA
enviada especial a Tibau do Sul (RN)

Não falta gente ímpar em Pipa, mas a gaúcha Cintia Junqueira, 39, é a número um. Chegou à praia há 12 anos, com Dostoiévski e Schopenhauer na mochila, depois de ter vivido na Europa e cumprido três anos de prisão.

"Os livros salvaram minha vida." Hoje, livreira e livre, só carrega nas costas o sistema solar tatuado e o Book Shop —sua casa e única biblioteca da região.

Na esquina da rua do Céu com a avenida dos Golfinhos, há livros em vários idiomas nas prateleiras, nas mesas, no chão e no teto —é para onde vão, presos por barbante, os julgados ruins e "enforcados" pela livreira.

Por lá circulam viajantes, líderes da comunidade, estudantes e professores —que dependem daquele acervo para pautar trabalhos escolares. A coleção de 2.000 livros foi montada com doações de turistas. Ali tudo se empresta ou se aluga, nada se vende. Entre os tesouros de Cintia estão um velho dicionário bilíngue sânscrito-inglês e uma edição alemã da "Odisséia", que ela trocou por um Sidney Sheldon.

Outro orgulho: "Fui a primeira a oferecer acesso à internet em Pipa e a primeira, no Rio Grande do Norte, a ter conexão via satélite. Os e-mails de muitos nativos foram criados aqui". Hoje, o acesso está bloqueado por falta de pagamento. Uma lousa na entrada avisa: "O Book Shop necessita urgentemente de placa-mãe de computador".

E está afogado em dívidas. Sua reestruturação é uma meta do programa Pipa Sabe. Com o Sebrae-RN e a UFRN, o grupo da USP estuda um plano de negócio para o espaço. O apoio prevê a formalização do contrato de aluguel e a informatização do Book Shop. Os observadores chegaram a cogitar a abertura de franquias. Mas como multiplicar esse clube de literatura sem clonar sua criadora?

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