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Carreiras e Empregos

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O texto abaixo contém um Erramos, clique aqui para conferir a correção na versão eletrônica da Folha de S.Paulo.

Poucas mãos concentram o mercado de aplicativos

Sedutor para jovens programadores, segmento vê sinais de saturação

FELIPE GUTIERREZ DE SÃO PAULO

O mercado de desenvolvimento de aplicativos para smartphones e tablets -programas que rodam em aparelhos móveis- não tem muitas barreiras de entrada. Ou seja, não é preciso investir grandes somas para lançar um app nas lojas virtuais.

Mas, mesmo assim, são poucas as empresas que têm conseguido fazer dinheiro com eles.

Desde 2008, quando a Apple abriu o sistema de operação para que desenvolvedores independentes tivessem seus aplicativos rodando em aparelhos, como o iPhone, programadores de softwares viram uma chance para desenvolver os próprios apps, vê-los ganhar popularidade e fazer dinheiro sem precisar de grandes investimentos.

Quatro anos depois, passado o frenesi inicial, muitos deles se dão conta de que a chance de isso acontecer "é igual a ganhar na loteria", como diz Flávio Stecca, 33, diretor de tecnologia e produtos da Movile, empresa de porte médio que tem 20 aplicativos no mercado, mas que se sustenta com a venda de programas para enviar mensagens para celulares.

O caso do Instagram, aplicativo de compartilhamento e edição de fotos criado por dois colegas de faculdade nos EUA (um deles brasileiro) e vendido por US$ 1 bilhão ao Facebook neste ano, é um em 700 mil (número de aplicativos na App Store em setembro, segundo a página especializada em tecnologia techcrunch.com).

APP MANIA

Uma história mais comum é a do programador Rafael de Souza, 29. Em maio de 2011, junto com um sócio, ele largou o emprego de desenvolvedor e iniciou uma empresa chamada Innovaty Solutions.

A empreitada foi financiada por um investidor-anjo que se dispôs a colocar R$ 150 mil na empresa.

A ideia era desenvolver uma série de apps para usuários de iPhone até que a empresa ganhasse notoriedade e, então, começasse a trabalhar para clientes corporativos -companhias que querem ter aplicativos com suas próprias marcas.

Mas o plano não deu certo. Os apps que a Innovaty tinha na loja da Apple recebiam boas críticas, mas nunca venderam muito.

O maior sucesso foi um aplicativo para gerenciamento de tempo de tarefas chamado Timesquare.

Souza estima que a receita total que conseguiram seja de US$ 3.000 -cerca de R$ 6.000, ou 4% do investimento de R$ 150 mil, que foi usado para equipamentos, local de trabalho, mão de obra e serviços terceirizados.

Fazer aplicativos não é só desenvolvê-los, diz Souza. Para que um app tenha sucesso, segundo ele, é preciso que seja visualmente interessante, tenha um público-alvo muito definido, seja fácil de usar e tenha um bom plano de marketing. "Não é nem um pouco trivial."

OFERTA

Não é preciso fazer um grande investimento para começar a vender nas lojas de aplicativos (as duas principais são a App Store, da Apple, e a Google Play, do Google). Paga-se uma taxa anual de US$ 99 (R$ 206) e 30% da receita das vendas em ambos os sistemas.

Esse "livre acesso" pode dar a ideia de que esse é um mercado em que pequenas e grandes empresas competem em igualdade, mas não é o que se vê na prática.

A consultoria de análises norte-americana Canalys estima que, nos EUA, metade da renda da venda de apps de 20 dias em novembro -cerca de US$ 60 milhões (R$ 125 milhões)- foi para apenas 25 empresas.

Dessas, apenas uma não é do setor de jogos: o serviço de músicas Pandora. Entre esses grandes vendedores estão nomes como Zynga e Disney.

"Essa é uma competição imperfeita, porque os consumidores têm preferências por produtos específicos, mesmo que haja outros com a mesma função", explica a professora de economia da PUC-SP Cristina Helena de Mello.

Ela adiciona que há uma "reação em cadeia" entre os consumidores: "Se um amigo usa, você usa também". Dessa forma, quem vende mais continua vendendo mais.

Lucas Longo, colunista da Folha e fundador do iai? (Instituto de Artes Interativas) concorda que há muita concentração, mas, para ele, ainda ouviremos falar de histórias de empresas que começam minúsculas e se tornam gigantes, porque esse é um mercado dinâmico.

EVA MORDEU A MAÇÃ

No começo, em 2008, era mais fácil, diz o programador Rodrigo Pessanha, 37. O número de aparelhos aumentou muito -a consultoria Strategy Analytics estima que no mundo há mais de 1 bilhão de smartphones. Mas aumentou também a competição, e assim ficou mais difícil faturar, afirma Pessanha, um pioneiro do desenvolvimento de aplicativos no Brasil.

Quando ele lançou o "Forca", uma versão do tradicional jogo de adivinhação de palavras que fez sucesso na App Store, havia 5.000 apps na loja (hoje o número é 140 vezes maior). Cerca de 15 eram nacionais.

Pessanha tem um emprego, ele nunca viveu só da venda de aplicativos. Mas a história dele inspirou outras pessoas a tentar ganhar dinheiro com isso.

Rodrigo Rocha, 28, leu uma reportagem sobre Pessanha em 2009 e resolveu que também iria vender na App Store. Com a mulher, Denise Vaz, 28, ele montou a RoDen (o nome é composto pelas primeiras sílabas dos nomes deles) e lançou três aplicativos.

O primeiro deles é um jogo chamado "Sopa de Letrinhas" que chegou ao mercado em dezembro de 2009.

Depois de alguns meses, Rocha estranhou a receita baixa obtida e começou a perguntar a outros desenvolvedores quanto eles estavam ganhando com as vendas de aplicativos.

Chegou à conclusão de que a divisão do bolo de faturamento dos apps fica concentrada apenas entre aqueles que estão no topo do ranking de vendas. E permanecer no topo é difícil.

Vaz lista algumas táticas: pedir para sites especializados em aplicativos resenharem o app e fazer promoções (com o preço mais baixo dá para subir no ranking e, enquanto o produto ainda está no topo, voltar ao preço antigo e "pegar uma rebarba" da atenção gerada com a posição alta, explica).

Os programas continuam sendo vendidos, mas o casal desistiu de fazer novos aplicativos. Em 2011, eles lançaram o último, o Cifra+, que possibilita a leitura de cifras de músicas em tablets. O app tem preço mais alto do que o comum, US$ 4 (R$ 8,30).

Eles ainda fazem ajustes no app e continuam recebendo dinheiro dos três programas (por mês, são cerca de R$ 1.800, valor que já foi mais alto, afirma Vaz).

Hoje, ambos trabalham na Universidade Federal da Bahia.

SEGUNDA TELA

Chamar a atenção dos donos de smartphones e tablets é difícil e poucas empresas conseguem, mas não é só para isso que os programadores de aplicativos trabalham.

Há um outro mercado, o de aplicativos customizados, também chamados de sob demanda. São apps desenvolvidos para grandes marcas.

Entre os publicitários, já se diz que, tratando-se de interação, a segunda tela (a dos aparelhos móveis) já tem mais importância do que a primeira, que é a dos próprios computadores de mesa ou laptops.

"No começo da internet, fazia-se hotsite para lançar campanhas. Hoje, com a maturidade que temos em termos de 'mobile', as marcas preferem lançar aplicativos", afirma Marcel Matsuda, 31, um dos sócios da agência Fri.To, que desenvolve apps para grandes marcas.

Uma empresa que queira ter seu próprio aplicativo irá gastar cerca de R$ 200 mil, ele estima.

Outra forma de ganhar dinheiro com aplicativos é inserir anúncios na tela dos programas.

A Jera, empresa de Campo Grande (MS), atende clientes corporativos, mas também tem os seus próprios apps.

Um deles, o Fun Sounds, tem um "banner" (retângulo de anúncio) que gera, por mês, uma receita de cerca de US$ 350. E a "audiência" do app não é baixa: são cerca de 500 downloads diários.

MUNDO REAL

A iPostal aposta em um modelo de negócio que se situa entre o aplicativo e o comércio de bens físicos, fora do ambiente digital.

Uma parte do negócio funciona como o Instagram: é possível capturar fotos com o smartphone e editá-las.

Depois, o usuário pode pagar R$ 3,99 para que a empresa imprima a foto e a envie pelo correio para o destinatário que o cliente escolher.

A empresa começou a funcionar em junho deste ano. Segundo Yussif Ali Mere, 24, um dos sócios, ainda não dá para viver da receita que ela gera, mas afirma que eles estão "quase lá". Ele não revela dados do faturamento.

OPÇÃO DE CARREIRA

Se para o desenvolvedor é difícil competir com as empresas estabelecidas no setor de aplicativos, quem consegue programar apps nos sistemas operacionais da Apple e Android não encontra obstáculos para conseguir um emprego.

Bruno Henrique Yoshimura, 26, formado em ciência da computação na USP, conta que no grupo de e-mails de sua turma de faculdade sempre há alguém anunciando "vaga mobile".

Yoshimura trabalha há três anos em uma empresa chamada Kekanto, que tem um aplicativo que possibilita aos internautas avaliar restaurantes, bares e serviços.

Ele diz que hoje um recém-formado recebe entre R$ 3.000 e R$ 6.000.

Diether Werk, 28, programador da Fri.To, acha que esse valor tende a aumentar no futuro.

Werk, como muitos outros programadores, aprendeu a tarefa sem passar pelo curso superior de ciência da computação.

Ele estudava veterinária quando começou a se interessar por escrever programas.

Werk explica que mesmo quem sabe escrever softwares para computadores precisa estudar muito para aprender a programar aplicativos, e que há diferenças significativas entre desenvolver um app dentro do sistema da Apple (chamado iOS) e para os aparelhos que rodam com o sistema Android.

Mas "não tem como saber isso [programar aplicativos em diferentes sistemas] e estar desempregado", diz Yoshimura.

Depois que a Innovaty Solutions faliu, em maio deste ano, Rafael de Souza, que sabe programar, voltou a desenvolver aplicativos para outras empresas.


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