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Ciência + Saúde

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Marcelo Leite

Vigilância sanitária eletrônica

O Brasil vai precisar de um Instituto Brasileiro de Mineração de Dados em Massa, além do velho IBGE

Todos os dias, milhões de pessoas fazem pesquisas na internet sobre saúde. Bilhões e bilhões de registros sobre as buscas ficam gravados.

Essa mina gigante de dados já é usada para detectar surtos de gripe e dengue. E, também, para descobrir efeitos colaterais imprevistos da interação entre remédios muito usados. Parece que nem toda vigilância eletrônica é do mal.

Um dos pioneiros nesse campo é Larry Brilliant. Que nome, não?

Trabalhando para a empresa Google, Inc. e usando o mecanismo de busca homônimo, ele e outros cinco pesquisadores demonstraram em 2009 que era possível detectar sinais de uma epidemia de gripe só com base em informações extraídas de consultas no buscador. A demonstração de princípio saiu no periódico científico "Nature" (vol. 457, págs. 1.012-1.014).

O pessoal do Google obteve dados geográficos dos Centros de Controle de Doenças (CDC) dos Estados Unidos sobre consultas médicas relacionadas com sintomas de gripe. Em seguida, comparou com as buscas de computador nas mesmas áreas, sem identificar ninguém.

Chegou-se assim a uma lista das 45 expressões mais correlacionadas com as estatísticas de atendimento. Com base nelas foi criado um modelo capaz de lançar alertas de possíveis surtos com pelo menos um dia de antecedência sobre o sistema tradicional de vigilância.

O modelo deu origem a um sistema automático, Flu Trends (www.google.org/flutrends), que hoje funciona em 29 países, inclusive Brasil. Outro serviço de alerta foi criado para dengue (www.google.org/denguetrends).

Virou moda. Para não ficar atrás, a Microsoft Research (braço de pesquisa da empresa de Bill Gates) lançou outra pergunta esperta: será que dá para descobrir, garimpando dados de buscas na rede, interações perigosas entre medicamentos antes mesmo que sejam identificadas pela vigilância farmacológica?

A equipe de Eric Horvitz verificou que dá. Após vir a público que os remédios pravastatina (para reduzir colesterol) e paroxetina (antidepressivo) podem provocar hiperglicemia (excesso de glicose no sangue) quando usados juntos, o grupo voltou aos registros das buscas anteriores ao anúncio para ver se conseguiria "prever" a associação.

Imaginado, dito e feito. Usando a incidência de buscas com expressões como "sede", "aumento de apetite" e "micção frequente", determinaram que elas estavam estatisticamente mais correlacionadas com buscas que envolviam ambos os nomes dos remédios do que com as buscas por só um deles. Ou seja, é possível criar sistemas automáticos de geração de hipóteses de interações insuspeitadas entre pares de remédios, para investigação posterior por farmacologistas.

Não é a primeira vez na história que a capacidade de agregar informações sobre comportamentos individuais abre todo um campo de conhecimento. Quando os Estados nacionais se tornaram complexos o bastante para exigir de governantes a manutenção de registros centrais de dados --de comércio e nascimentos, por exemplo--, nasceu a estatística, ali pelo século 17.

Alguém consegue imaginar a administração de um país, hoje, sem recurso à estatística? Não. Em alguns anos, o Brasil precisará também de um IBMDM (Instituto Brasileiro de Mineração de Dados em Massa), além do bom e velho IBGE.


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