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Antonio Prata

Cachimbo da paz

É com enorme felicidade que vejo brotar, na terra de ninguém, uma semente capaz de unir a direita e a esquerda

Muitos já apontaram como as interpretações sobre os "rolezinhos" explicitaram o nosso Fla-Flu ideológico: de um lado a direita, temendo as invasões bárbaras e exigindo a Tropa de Choque, do outro a esquerda, achando bárbaras as excursões e enxergando um choque de democracia. A polarização não é novidade. Há décadas Caetano Veloso cantou "quem vai equacionar as pressões do PT, da UDR e fazer desta vergonha uma nação?", e a impressão que se tem, lendo o que se escreve no Twitter, no Facebook e pelos blogs, é que estamos longe de encontrar uma resposta. Pois é com enorme felicidade que eu vejo brotar uma semente no meio da terra de ninguém, vejo surgir uma força capaz de colocar o leitor da "Veja" e o DCE da FFLCH na mesma roda, olhando, juntos, para uma única direção. Refiro-me à maconha.

Falo sério. Afinal: que outro assunto consegue pôr Fernando Henrique Cardoso e Marcelo D2 do mesmo lado? (Embora FHC não possa ser chamado "de direita" nem D2, "de esquerda", a distância entre as duas figuras dá uma ideia da amplitude do leque --ou, melhor dizendo, do diâmetro do cone-- da Cannabis). No ano passado, fui ao lançamento da Rede Pense Livre --sobre a qual já escrevi, aqui. Trata-se de um grupo apartidário, com pessoas de diversas áreas, dedicado a "promover um debate amplo e qualificado por uma política sobre drogas que funcione". Partem do princípio de que a "guerra às drogas" é mais letal do que as mesmas e defendem a descriminalização da maconha. A cerimônia de lançamento da Rede foi no Instituto Itaú Cultural, e no palco estavam dois amigos meus: um do mercado financeiro, outro da Mídia Ninja --concordando.

Embora haja partidários da legalização nas duas pontas (sem duplo sentido) do espectro político, é curioso como cada lado chega à sua opinião por caminhos diferentes. A esquerda tende a abordar mais as implicações sociais da proibição, como o tráfico, o tráfico de armas e a violência que os acompanha. A direita levanta a bandeira da liberdade individual: quem o Estado pensa que é para dizer o que eu posso ou não posso fazer com o meu corpo? Há também entre progressistas e conservadores aqueles que não politizam tanto a coisa e só querem poder ouvir "Dark Side of the Moon" comendo goiabada com Leite Moça sem correr o risco de ter o quarto invadido pelo Capitão Nascimento.

É claro que o tema não é consenso nem à destra nem à sinistra, mas também aí a maconha faz bem à política brasileira, pois, se irmanando no combate à "erva do diabo", pudibundos do PC do B e da TFP encontrarão um terreno comum, iniciando um diálogo antes inimaginável.

O único problema da ausência de barreiras ideológicas em relação à Cannabis é que, se ela for legalizada, cada um vai querer puxar a brasa para a sua sardinha. Caso a lei mude num possível segundo mandato da Dilma, o PT vai se dizer o pai (ou a mãe) da ideia, enquanto os tucanos vão espernear alegando que, se não fosse por FHC, estabilizando as opiniões, nada disso haveria acontecido --e quem poderá afirmar que não terão razão?


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