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Grafiteiros bancam viagem ao Sul com a arte dos muros
Dupla de São Paulo foi até a Argentina e o Uruguai oferecendo grafites em troca de hospedagem e comida
Eles deixaram suas pinturas em dez cidades e agora querem transformar a aventura em documentário
O carro de Patrick Toledo, 27, estava pronto para uma longa viagem. No porta-malas havia roupas, garrafas de água, petiscos e... latas de spray e tinta. Além de rolinhos, fitas adesivas e equipamentos para grafite.
De férias no trabalho, o grafiteiro, conhecido como Pack, e seu amigo Eduardo Marinho, 29, o Credo, deixaram São Paulo em 14 de dezembro do ano passado com um objetivo: conhecer a cena de grafite do Sul do país, da Argentina e do Uruguai e pintar muros no caminho.
No final, os grafites acabaram ajudando a custear a aventura.
Viajar de carro --um Sandero 2009-- foi sugestão de Patrícia Toledo, 35, mulher de Pack, que morre de medo de avião e embarcou no tour junto com o marido.
"Já eu disse que só iria se pudesse pintar muros no caminho", conta Pack.
Mas e o dinheiro para bancar a viagem? O bônus das férias não dava para gasolina, hospedagem e comida.
Os artistas então estamparam 130 camisetas e venderam a amigos por R$ 50. O "financiamento coletivo" deu certo e bancou toda a gasolina.
O trio partiu da Santa Cecília, no centro da capital paulista. Pararam em dez cidades, como Curitiba e Montevidéu. Em todas, deixaram ao menos um grafite.
"A gente queria dormir em casas de grafiteiros que encontraríamos", diz Credo. Em algumas cidades deu certo.
Em outras, como Curitiba e Florianópolis, eles tiveram que trocar grafites por hospedagem para economizar.
"Oferecíamos aos donos de hostels: fazemos um grafite no seu muro e ganhamos uma noite", diz Pack. Em dois, a troca funcionou.
Na praia da Armação, em Florianópolis, pintaram o barco de um pescador. "Ele nos deu R$ 50 e um saco de mariscos, que comemos na praia mesmo", conta Credo.
Em Uruguaiana, no limite entre Brasil e Argentina, o trio foi impedido de passar a fronteira porque Pack estava sem o RG. Procurou na bagagem, mas não o encontrou.
Então se lembrou: esquecera a identidade em casa, no AE Carvalho, bairro no extremo da zona leste de São Paulo. Não queria desistir e voltar. Mas o que fazer?
"Liguei para minha mãe, que foi na rodoviária do Tietê. Lá ela conheceu um argentino que estava indo para Buenos Aires de ônibus."
Dois dias depois, o argentino encontrou os brasileiros e entregou o documento. Liberados na fronteira, o trio continuou a viagem.
Os artistas depois pintaram muros em Buenos Aires, onde ficaram na casa de um artista local e deram entrevista numa rádio. Deixaram grafites também em Colônia do Sacramento, Montevidéu e Punta del Este, no Uruguai.
Quando voltaram para São Paulo, no meio de janeiro, o saldo da viagem era de mais de 6.000 km percorridos.
"Conheci lugares maravilhosos, foi a viagem da minha vida", diz Patrícia.
Pack e Credo vão sortear na quinta-feira dois painéis de grafite entre os amigos que, em dezembro, compraram as camisetas e ajudaram a bancar a viagem --que pretendem transformar em documentário.
Mas eles não param aí: o próximo plano é comprar uma Kombi e pegar a estrada de novo. "Ir para o Norte, pra Colômbia...", sonha Credo.