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Cotidiano

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A operação do Dr. Kalil

THAIS BILENKY DE SÃO PAULO

"Todos os pesos-pesados votaram em mim. Paulo Maluf, Delfim Netto, Ives Gandra Martins, Lázaro Brandão, [presidente do conselho] do Bradesco. Este não ia votar no Itaú, né?!"

O advogado Kalil Rocha Abdalla, 72, gaba-se de ter desbancado o médico José Luiz Setúbal, filho do banqueiro do Itaú, na disputa pela provedoria da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo em abril deste ano.

"Setúbal desceu o porrete, disse que havia má administração, que tinha um passivo de R$ 300 milhões. Tem mesmo. Nunca se escondeu."

Na Santa Casa desde 1988, Abdalla está em seu terceiro mandato como provedor --o cargo máximo da instituição. Desde 2008, quando assumiu, a dívida bancária do maior hospital filantrópico do Brasil saltou de R$ 70 milhões para R$ 350 milhões, segundo Setúbal.

Nesta semana, a crise tomou ares dramáticos com o fechamento do pronto-socorro por 30 horas, devido à falta de materiais.

MORDOMOS

A instituição preserva a mesma estrutura desde sua fundação, há quase 500 anos. Os irmãos, espécie de conselheiros com direito a voto (como são os "pesos-pesados" de Abdalla), elegem a cada três anos a mesa administrativa, composta pelo provedor, seu vice, o tesoureiro, o escrivão, os mordomos (cuidam da execução de determinadas áreas) e os irmãos mesários --um conselho deliberativo.

Nenhum desses cargos é remunerado. Abdalla diz que vive da advocacia.

Pensa em modernizar a gestão? "Tudo interessa. Se alguém vislumbrar alguma coisa, na hora nós vamos fazer", responde Abdalla.

"Quero receber um atestado de... honestidade, como se diz? Idoneidade. Vou mandar fazer um diploma, pendurar na parede e chamar a imprensa. Eles vão cair do cavalo."

Abdalla se refere à auditoria solicitada pelo governo do Estado de São Paulo para examinar por que, afinal, as contas não fecham numa instituição cujo orçamento é de R$ 1,3 bilhão. "No mês passado, estive no BNDES pleiteando um refinanciamento da dívida. Só em juros pago R$ 3 milhões por mês", explica.

CHORADEIRA

O último dia 16 de abril vai ficar gravado na memória deste advogado formado nas arcadas do largo de São Francisco (USP), de família natural da cidade de Patrocínio Paulista, a 415 km da capital.

Todos os dias, levanta-se às 6h, coloca uma roupa de ginástica e caminha menos de um quarteirão até o clube Paulistano, nos Jardins. Lá faz musculação e esteira com um personal trainer. Na saída, costuma encontrar-se com a Turma do Chapinha, 40 amigos que fazem um sorteio com fichas para decidir quem pagará o café da manhã do dia.

No dia 16, Abdalla vestiu uma camisa bordada com suas iniciais. Colocou abotoaduras douradas igualmente identificadas. Passou gel no cabelo, borrifou gotas de perfume e, acompanhado da mulher, Anna Maria, e da filha mais velha, Ana Carolina, rumou para a Santa Casa.

Seis horas depois, choraria ao saber que fora escolhido provedor pela terceira vez.

"Eu choro muito. Choro para o [Geraldo] Alckmin [governador de São Paulo], chorei para o [Alexandre] Padilha, quando ele era ministro da Saúde. Sempre que dá eu tento arrancar [dinheiro]."

Mas ainda era cedo para comemorar. Pegou seu carro e dirigiu até o Morumbi, estádio do São Paulo Futebol Clube, do qual é sócio desde 1951 e onde exerceu cargos como o de diretor jurídico.

Prevendo que perderia a eleição para presidente do clube, retirou sua candidatura de oposição, alegando uma manobra da situação.

Seu adversário havia se transformado em seu inimigo, segundo suas palavras. Carlos Miguel Aidar, irmão na Santa Casa, fizera campanha para Setúbal e agora assumiria a gestão do São Paulo.

"Ele marcou a votação no mesmo dia para me ferrar. Estou revoltado, não aceito isso. Não tenho mais o menor interesse em falar com ele."

O jurista Ives Gandra Martins, por exemplo, votou em Aidar no São Paulo e em Abdalla na Santa Casa.

"Fazer o quê?" Kalil buscou Anna Maria e foram comemorar com médicos a vitória do dia no restaurante Via Castelli, a duas quadras da Santa Casa, com um vinho português.

ESTÁGIO

Casados há 43 anos, Anna Maria e Kalil têm dois filhos --Ana Carolina, 41, e Fernando, 39. A presença da família na irmandade é frequente.

Os quatro foram nomeados irmãos. O filho chegou a trabalhar na Santa Casa remuneradamente nos primeiros anos da gestão de Abdalla como provedor.

Fernando tinha 34 anos e atuava na área jurídica. Segundo o pai, não se trata de nepotismo --o filho era apenas um "estagiário". Fernando hoje é corretor de imóveis.

REFERÊNCIA

O goleiro Rogério Ceni não empolga mais. A volta do meia Kaká ao Morumbi não é tão comemorada. Por quem o coração torcedor de Kalil Rocha Abdalla vibra? "O melhor se chama José Ribamar, o Canhoteiro (1932-1974)."


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