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Gangsta gospel

Rappers evangélicos utilizam a 'linguagem das ruas' em músicas como 'É Us Cren'ts' e chegam onde 'o cara de terno e gravata não alcança'

ANNA VIRGINIA BALLOUSSIER DE SÃO PAULO

Eles cantam sobre a "vida loka" da periferia, com roupas "de mano", em meio a carrões "da hora". E fazem isso em nome de Deus.

Pastor Ton, Márcio Santos e Paulo "Profeta" Deivid são expoentes do gangsta gospel.

Esse estilo musical une pregação evangélica a um gênero particular do rap, com letras que falam sem rodeios sobre drogas ("bagulho mesmo"), criminalidade ("a chapa esquenta") e violência policial ("os gambé embaça").

O gangsta --derivativo de gângster-- conta a vida como ela é. E ela nem sempre era bonita nos lugares de onde vieram pioneiros como os americanos Snoop Dog e Tupac Shakur (assassinado há 18 anos). "Sempre sonhei em fazer clipe que nem os gringos", diz Pastor Ton, 36, autor de "Serial Killa" e "121" (número do artigo sobre homicídio do Código Penal).

Ele curte carros "lowrider", aqueles que andam quase arrastando no chão e quicam feito bola de basquete, comuns entre gangues nos EUA.

"Aqui, quero que pulem aos pés do meu Deus", diz.

O vídeo "É Us Crent's" traz um Chevrolet Impala 1962. Na vida real, o pastor tem um Gol 1999 e duas lojinhas de salgado. O dízimo que recebe, diz, mal paga os R$ 600 do aluguel de sua igreja em Guaianases, zona leste de SP.

Próximo a uma boca de fumo, o galpão com fachada grafitada abriga a Comunidade Profética Descendentes de Davi, liderada por ele e pela mulher, a ex-prostituta e agora pastora Angela de Jesus.

Quando compõe sobre o demônio que impera com fuzil em punho", Ton tem uma meta: "Converter a cultura gangsta aos pés do Senhor".

MUDANÇA DE HÁBITO

Quando começou, na banda Criminal Base, não era pastor nem Ton: atendia por Everton Santos, um rapper que andava com um revólver calibre 32 ("enferrujado, se atirasse só dava tétano").

Mudou do vinho para a água após a primeira ida à Assembleia de Deus. "De repente, estava de cabelo curto, sem brinco, todo de social."

Percebeu, contudo, que sua forma de pregar o Evagelho era gangsta. Afinou o discurso e folgou as roupas.

A blusa é três vezes seu número. "Na cadeia, não se escolhe tamanho". Usa boné dos Los Angeles Kings (um time de hóquei), óculos escuros (faz sol), relógio dourado (comprou no Brás) e luva de ciclista (acha estilo). "Entro em lugares que os caras de terno e gravata não entram."

O tatuado Márcio Santos, 33, também fala a língua dos jovens. Na sua juventude, vendia crack e cocaína. Tentativa de "crescer pior" do que seu "Superman", o irmão Mauricio --traficante morto a facadas, em emboscada com 48 presos de uma facção rival.

Virou pastor e montou com mulher e filho o grupo Terceiro Dia --alusão à ressurreição de Cristo. "Morre o velho homem, nasce a nova criatura."

No clipe "Amor em Extinção", cenas da família se intercalam à de palhaços assustadores ""imagens tiradas do "Cine Trash", programa que Zé do Caixão apresentava na Band. "É o próprio demônio dando risada da humanidade", explica a simbologia.

Em sua casa em Francisco Morato (Grande SP), ele e o amigo Paulo Deivid, 31, da Profetas da Z/O, conversam sobre o festival Louvorzão --como atração, o Grupo de Pagode Resgate e a Pura Unção.

Deivid diz que foi um adolescente "loucão, que chapava de bebida". Não mais. "Nosso foco é resgatar os manos da rua como fomos resgatados". Uma batalha e tanto, crê. "É Deivid contra Golias."


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