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Artista intriga moradores do Grajaú com mural de 32 m

Alexandre Orion criou metáfora para desapropriações na região da Billings

Crianças do bairro tentam decifrar imagem de bebê gigante que parece brincar com casas como as delas

FERNANDA MENA DE SÃO PAULO

Um bebê gigante invadiu a paisagem monótona do Grajaú, periferia sul da capital paulista, na última semana.

Pintada em preto e branco na empena cega do edifício que abriga o CEU Navegantes, a criança ostenta quase 30 metros de altura e contrasta com o cenário de tijolos vermelhos aparentes, lajes e caixas d'água azuis, típico das favelas de São Paulo.

Na intervenção do artista Alexandre Orion, 36, que se notabilizou ao desenhar caveiras "limpando" a fuligem de túneis da cidade (leia texto na pág. ao lado), a criança parece brincar com casinhas iguais à da favela que cerca a pintura e com a qual cria uma ilusão de continuidade.

Um olhar mais atento, no entanto, revela que as casinhas parecem mesmo estar sendo destruídas. "A provocação do trabalho é esta. A criança está brincando com casas, mas elas estão meio destruídas", explica Orion.

Isso porque o local onde está pintado o mural, batizado de Cantinho do Céu, sofre um processo constante de desapropriações por ser uma área de mananciais da represa Billings, responsável pelo abastecimento de cerca de 4 milhões de pessoas na capital. "É um tema delicado e o processo de remoção das famílias é o mais perverso possível", diz o artista.

DECIFRA-ME

"Quis usar uma imagem agradável e doce, como a de uma criança, para confrontar brincadeira com destruição, relação lúdica com manipulação do planeta", explica ele. "Não quero falar para o mundo das artes. Quero falar com o todo o mundo. Cada um a interpreta o mural com seu próprio repertório."

Entre as crianças e jovens que circulam pelas vielas próximas à obra, a imagem onipresente encanta e intriga.

Na tentativa de decifrar o bebê gigante, Pedro Henrique Pereira, 13, foi categórico: "É uma criança da favela mudando o país de posição."

Ágatha Fernanda Nascimento Souza, de 4 anos, dá sua versão para a questão da desapropriação debatida pelo artista. "O bebê está pegando as casinhas das pessoas e colocando em outro lugar."

Joseane Souza de Deus, 11, prefere apenas o prazer estético da imagem, sem grandes devaneios: "É algo diferente para nós. Vejo todos os dias no caminho para a escola. Ficou muito bonito."

Intitulada "Apreensão", a obra é a primeira do tipo que o artistas faz na cidade, depois de intervenções como ela em Frankfurt, na Alemanha, e no Rio de Janeiro.

"O desenho casou com a paisagem do Grajaú. Os moradores do entorno ficaram maravilhados porque dá para ver o trabalho de várias vielas dali", diz Mariana Belmont, 26, produtora do coletivo Imargem, que reúne artistas e ativistas da periferia sul de São Paulo e organização da qual partiu o convite para a intervenção de Orion.

"Pra gente, é um ganho enorme. O mural será um legado para o bairro. O trabalho está aí para provar que a periferia também pode se envolver com arte e ter trabalhos lindos como este em sua paisagem."


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