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Marcos Augusto Gonçalves

Do shopping ao Centro Cultural

Enquanto a feira de fotografia ocupava o terraço do JK Iguatemi, o CCSP comemorava seus 30 anos

"Não sei se me lembra Dubai ou Miami", disse a galerista sentada à minha frente, enquanto esperávamos ansiosos o garçon abrir a garrafa de tannat que acompanharia o promissor cardápio da casa. A mesa, situada próxima à grande vidraça, nos deixava ver uma feérica São Paulo de edifícios espelhados e modernosos. Eles não param de subir na região da Vila Olímpia, onde domina agora o shopping JK Iguatemi.

A nova catedral do consumo recebeu no fim de semana a sexta SP Arte/Foto, edição da feira de arte paulista dedicada à fotografia. Galerias de São Paulo e de outras cidades exibiam suas obras no amplo terraço do shopping, onde se chega depois de atravessar espaços grandiloquentes e vitrines de Pradas, Guccis e Miu Mius.

Um artista plástico, Antonio Malta Campos, escreveu no Facebook que as bienais às vezes lembravam a ele os shopping centers, embora nelas arte e consumo pareçam separados. Com a realização da feira de fotografia num shopping, essa "dualidade angustiante" é eliminada. "O mundo da arte e o mundo do consumo é o mesmo. É um alívio, na verdade", postou ele no FB.

Estou de acordo, é um alívio.

A garrafa de tannat já foi servida, e decido-me pela comparação com Dubai. Ou quem sabe com alguma cidade chinesa. A cena toda, a feira, o shopping, o restaurante, os novos prédios de São Paulo, se inscrevem perfeitamente no imaginário dos "emerging markets", categoria, afinal, que passou a nos definir nesse admirável mundo novo em que vivemos. O fato de que ali perto sobreviva, espremida, a favela Coliseu, serve para dar ao quadro a inevitável pincelada de contradição social. O luxo e o lixo nosso de cada dia.

Dizem que shopping center é praia de paulista. Não acho uma boa comparação. Os parques e as ciclofaixas de fim de semana é que de fato estão cumprindo esse papel na cidade sem mar.

Os shoppings centers são cápsulas onde se experimenta um simulacro perverso de sociabilidade civilizada, na qual o consumidor vale mais que o cidadão. Talvez a principal mercadoria vendida pelos shoppings seja justamente essa experiência de uma "cidadania" segura e estável, impermeável aos desajustes das ruas. A paz das iluminadas alamedas do consumo.

Tornou-se um clichê, por outro lado, considerar os shoppings um sintoma maligno de uma cidade que não tem comércio de rua, é insegura e elitista. Não é bem assim -e bastaria a 25 de Março para demonstrar que São Paulo dificilmente se deixa apreender por ideias prontas e simplificadas a seu respeito.

No mesmo fim de semana em que a feira de foto atraía bacanas e modernos ao shopping, o Centro Cultural São Paulo, na Vergueiro, abria uma exposição comemorativa de seus 30 anos.

É sempre um prazer entrar naquele prédio, projetado por Eurico Prado Lopes e Luiz Benedito de Castro Telles. As rampas, a sustentação, a opção pela horizontalidade, a luz e os jardins sempre impressionam. O que mais chama a atenção, contudo, é a vida que ali transcorre, a biblioteca frequentada, as mostras de arte e o convívio republicano. Curiosamente, embora o CCSP seja mais poroso e aberto à rua, também ali, como nos shoppings, nos sentimos num mundo cujas regras de convivência parecem não valer do lado de fora. Pelo menos ninguém precisa pagar por isso.


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