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Agora, professor

Após nadar cachorrinho em Sydney, africano vira técnico e leva time a Mundial

PAULO ROBERTO CONDE DE SÃO PAULO

Intimidado pela grandeza da instalação, ele só percebeu a gafe ao subir no bloco de largada. Esqueceu-se de amarrar o cordão da sunga.

Pôs-se na raia 5 sem jamais ter competido em uma piscina de 50 m e sem rivais.

Universitário, nada habituado à natação competitiva, estava ali pois fora o único a responder a um anúncio da federação de natação da Guiné Equatorial, país africano de cerca de 700 mil habitantes, que chamava candidatos a nadar na Olimpíada.

Dada a partida, tentou de início não perder a sunga e os óculos dados por um técnico sul-africano por caridade.

Depois, para não morrer de cansaço, terminou a prova no estilo "cachorrinho".

Eric Moussambani Malonga, então com 22 anos, nem precisou de 15 minutos de fama para ter reconhecimento mundial. Bastou 1m52s72.

Com esse tempo Moussambani completou sua eliminatória dos 100 m livre nos Jogos de Sydney, em 2000.

Se comparada ao recorde mundial, que era 48s18 naquele 19 de setembro, a performance durou uma eternidade. Mas foi exatamente a lentidão que o tornou um anti-herói. Uma celebridade.

Com o tempo, a curiosidade por Moussambani arrefeceu. O "astro" não foi mais a qualquer Olimpíada e se aposentou em 2007, sem alarde.

Hoje, aos 34, mais gordo, com cavanhaque e tatuado no braço esquerdo, ensaia a volta ao esporte competitivo.

Será o treinador de quatro nadadores compatriotas no Mundial em piscina longa (50 m) de Barcelona, em julho.

Seus pupilos no evento são Pilar Asangono, 18, Rita Okenve, 18, Christian Mguba, 21, e Diosdado Joaquin, 23.

A aventura como técnico começou há um ano e quatro meses, após convite da federação de natação local.

Decidiu conciliar o cargo com o de especialista em tecnologia da informação na empresa americana de exploração de petróleo onde trabalha na capital, Malabo.

Das 8h às 16h, é funcionário. Às terças, quintas, sextas e aos sábados, das 18h às 22h, treina 36 nadadores em uma das duas únicas piscinas de 50 m do país -uma fica na capital, e a outra, em Bata.

Elas foram erguidas após pedido de Moussambani ao presidente do país, o ditador Teodoro Mbasogo, em 2006.

"Com as piscinas, os jovens têm melhores condições para aprender a nadar. Mostro meus vídeos e conto histórias para inspirá-los", disse à Folha o ex-nadador, que doou a roupa usada em Sydney ao museu do COI (Comitê Olímpico Internacional), que fica em Lausanne, na Suíça.

O Mundial será a estreia internacional de Moussambani -hoje pai de Anthony e Eric e marido de Neida- como técnico. Sua fama internacional, porém, não garantiu acesso facilitado à elite.

Exemplo é que não conseguiu emplacar nenhum atleta nos Jogos de Londres-2012.

"Não ir à Olimpíada foi uma frustração", afirmou.

Agora, para conseguir levar a delegação a Barcelona, até protestou e fez campanha em sua conta no Twitter.

"Tive que brigar para ir ao Mundial. Mandei e-mails e pedi vaga à Fina [federação internacional]", contou.

A organização do Mundial confirmou à Folha a participação da equipe da Guiné.

Mesmo com o aval, a missão de Moussambani está longe de ser concluída.

Ele precisa arrumar verba para despesas aéreas, de acomodação e de equipamentos para seus quatro nadadores.

"Ainda não temos material de qualidade. Compro equipamentos por minha conta e repasso aos atletas", afirmou o agora técnico, que pediu ajuda do governo e da Fina.

À espera da entidade, ele trata de elevar a confiança dos comandados. "Digo aos nadadores para não se preocuparem. Só quero que causem uma boa impressão."

A mesma boa impressão que Moussambani causou ao mundo há quase 13 anos. Ao fim do contato o técnico pediu um esclarecimento.

Desde a famigerada manhã em Sydney, em 2000, ele evoluiu. "Meu melhor tempo nos 100 m é 58 segundos. Melhorei quase um minuto."

Em tempo: o recorde mundial da prova, do brasileiro Cesar Cielo, é 46s91.


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