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Crítica - Drama

Filme de Karim Aïnouz perde boa força poética que apresenta no início

"O Abismo Prateado" tem Alessandra Negrini no papel de uma mulher abandonada em sua jornada dolorosa

INÁCIO ARAUJO CRÍTICO DA FOLHA

Uma cena define bem "O Abismo Prateado": aquela em que Violeta (Alessandra Negrini), a heroína, pedala em sua bike. Por trás, vemos aparecer um carro ensandecido, que passa por ela tão rápido, tão inesperadamente, que o mero susto derruba a bicicleta.

O pequeno incidente, apesar da brutalidade, revela algo que é próprio ao filme: a vida é cheia de surpresas. O inesperado é parte dela.

Violeta o experimenta duas vezes em pouco tempo: a primeira é quando se vê abandonada pelo marido (Otto Jr.). Não há prévio aviso, apenas um recado no celular: "Fulana, eu não te amo mais etc.". Então sua vida desmorona.

Até ali tudo parece assentado: o marido, a profissão de dentista, o filho. Tudo no lugar. Mas logo de início sabemos que há uma sombra: há algo de fugidio em sua expressão. O filme trabalha esse momento inicial muito bem: lança suspeitas, cria expectativas.

Mesmo a ideia da profissão de Violeta é interessante: o cinema explora pouco essa atividade em que, justamente, o dentista mantém um completo controle sobre seu paciente. Ao mesmo tempo, ver Violeta e o filho de bicicleta, nas ruas do Rio, transmite essa ideia de fragilidade das coisas: tudo é provisório.

Essa tocada forte do início perde em poesia, ao contrário de "O Céu de Suely", do mesmo Karim Aïnouz. Entramos em um filme de uma personagem só. Violeta em três tempos: a busca do marido, a elipse do luto, o inesperado.

Embora desse terceiro estágio o filme retire alguns bons momentos (como o passeio pelo aeroporto deserto), e Violeta, alguns ensinamentos (sobre conviver com a solidão, sobre os motivos dos outros etc.), o fato é que não reencontra mais sua força inicial. Exceto, talvez, no plano final, em que a mulher parece ter, enfim, cumprido sua jornada de dor.

Ou não. É um belo plano de Violeta, de costas, afastando-se: é o desconhecido, novamente, que se abre a ela.

Ao menos agora ela sabe do que se trata. A música de Chico Buarque ("Olhos nos Olhos") tocada ali a todo vapor pode ser bela, mas desvia o sentido da cena para uma ideia de fim de sofrimento, quase um "happy end", mas não condiz muito com o que o filme desenvolve.


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