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Ilustrador americano faz ode à liberdade
Em "A Parte que Falta", que sai no Brasil, Shel Silverstein retrata busca pela completude
Em maio de 1976, os fãs do ilustrador americano Shel Silverstein esperavam ansiosos a publicação de "A Parte que Falta". A expectativa logo se transformou em choque.
"Os pais que dois anos antes compraram Where the Sidewalk Ends' se perturbaram com o conteúdo do novo livro", diz Lisa Rogak, biógrafa do autor.
As ilustrações e os poemas de "Where the Sidewalk Ends" (1974) abordam situações comuns da infância sob um prisma cômico e surreal.
"A Parte que Falta", publicado recentemente pela Cosac Naify e sexto livro de Shel Silverstein (1930-1999) lançado no Brasil, narra a história de um ser circular em busca da completude. Quando o personagem acha a parte que lhe falta, percebe que a felicidade está além desse encontro.
"Esse é um dos livros mais negligenciados de Silverstein", afirma Rogak, autora de "A Boy Named Shel".
"Eu poderia ter finalizado a obra naquele ponto", disse Silverstein à biógrafa para explicar a passagem em que o ser com formato de pizza conhece a sua companheira. "Mas a procura continua e essa é a loucura do livro."
Os leitores costumam investigar "os significados ocultos" das obras de Silverstein, segundo Rogak. "Essa atitude o frustrava. Ele queria apenas contar histórias."
O ilustrador percebeu nesse esforço um desejo por certeza. Para a biógrafa, "A Parte que Falta" representa uma ode à liberdade individual.
A autonomia para expressar a própria essência gerou uma continuação cinco anos depois. "The Missing Piece Meets the Big O" (1981), que a Cosac Naify vai publicar em 2014, expõe uma trajetória semelhante de desencontros.
"Silverstein ia na contramão", diz Rogak. Ele se criou entre dois movimentos de contestação. "Os beatniks e os hippies foram suas companhias tanto em Nova York quanto em São Francisco."
O ilustrador não perdoou os indivíduos professorais. A seu ver, não havia diferença entre a arrogância de quem era contrário ou favorável ao establishment. "Ele fez piada com os pontos fracos dos descolados e dos caretas", afirma Mitch Myers, sobrinho e administrador do seu acervo.
Silverstein estreou como autor infantil com "Leocádio, o Leão que Mandava Bala" (1963). Teve o apoio de Ursula Nordstrom (1910-1988), editora da extinta Harper & Row. Nordstrom declarou ser sua missão publicar "bons livros para crianças más".
Ao rejeitar a necessidade de lições de moral, ela fez sucesso. Mais de 20 milhões de cópias dos livros de Silverstein foram vendidos.
Antes de 1963, ele ganhara destaque com cartuns para a "Playboy". Ao longo da carreira, escreveu roteiros, peças teatrais e composições, como "A Boy Named Sue", hit do cantor Johnny Cash.
"Silverstein era mais interessado na diversidade criativa do que outros autores infantis", diz Rogak.