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Crítica teatro

Peça usa metáforas para tratar do suicídio

'Azirilhante', concebida e atuada por Flavia Melman, é uma experiência teatral singular, com potencial para encantar

LUIZ FERNANDO RAMOS CRÍTICO DA FOLHA

O teatro como ato de cura. "Azirilhante" evoca perda terrível e revela o amadurecer de uma jovem atriz.

Concebida e atuada por Flavia Melman, a encenação tem texto e direção de Daniela Duarte. A experiência vivida por Melman, revista pelos olhos cúmplices de Duarte, resulta na fábula de uma filha de mãe suicida.

Por mais trágica que a narrativa se anuncie, evita a literalidade dos fatos e migra para regiões simbólicas, ou metafóricas, onde o ar torna-se mais respirável e se contorna o miolo inatingível da dor.

Esse distanciamento talvez reflita a circunstância de alguém que viu o evento fatídico com olhos infantis e só consegue projetar a mãe perdida com estereótipos.

A montagem se tece na combinação de três registros dramáticos. Um apresenta a mãe, ou a memória de suas idiossincrasias, que alcança momentos de intensidade emocional. Outro recorda a filha e o arsenal de alegorias com que elaborou seu destino imprevisto. E um terceiro é quase performático, no sentido de ser a própria atriz se revelando no presente.

Em qualquer um desses planos, o movimento é de retirada e de expansão para fora dos fatos reais.

Ao mesmo tempo que se está olhando o pesadelo, cria-se uma dimensão poética que, seja nos ditos premonitórios da mãe, seja nas conversas da filha com seu amigo imaginário, ou nas brincadeiras da atriz com o público, protege a ferida cicatrizada que se está reabrindo.

Flavia Melman, atriz com características marcantes, merece elogios não só pela coragem artística de trazer à tona traumas vividos, como pelo desempenho na sustentação desse projeto.

Uma limitação do trabalho é a de ter mantido seu objeto de interesse, a mãe, incapaz de revelar-se mais plenamente. Por exemplo, o fato de ela ter comprado, pouco antes de morrer, o direito de nomear uma estrela, que inspira o nome da peça e aparece detalhado no programa, poderia tornar-se matéria cênica.

"Azirilhante" é uma experiência teatral singular, com potencial para encantar pela inteireza com que sua protagonista se coloca nela.

Merece ser vista e comentada, até para que, em processo, possa se aperfeiçoar. Mas, com certeza, a criadora alcançou ali um brilho que a liberta de sua sombra.


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