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Crítica Não Ficção

Estatístico pop recomenda considerar o poder do acaso

Autor que previu reeleição de Obama ataca era de análises por máquinas

MARCELO SOARES DE SÃO PAULO

Nate Silver ganhou fama mundial em 2012, ao acertar a margem de vitória na reeleição de Obama. Estatístico e blogueiro do "New York Times", ganhou status de guru e virou personagem de todo tipo de piada sobre previsões.

Fora a aplicação política, a "bola de cristal" com a qual Silver puxou o tapete de quem faz previsões não tinha nada novo. Ele mesmo admite em "O Sinal e o Ruído", que sai agora pela Intrínseca.

Silver agregou pesquisas estaduais de opinião e aplicou a elas o teorema das probabilidades condicionais proposto no século 18 pelo inglês Thomas Bayes. É uma árvore de decisão, levando em conta chances de falsos positivos (prevê vitória, mas dá derrota) e falsos negativos (prevê derrota, mas dá vitória).

O livro traz várias situações que envolvem previsão e mostra como o descuido com o acaso pode fazer o leigo e, principalmente, o especialista se perderem pela sedução do ruído antes de encontrarem o caminho do sinal.

Aos 20 e poucos anos, Silver abandonou o emprego para viver de jogar pôquer on-line. Em 2006, o Congresso americano passou a debater a proposta de tornar ilegal o pôquer eletrônico. Ele passou a acompanhar política e a achou enfadonha. Faltava método, sobrava palpite.

Tomando emprestada uma ideia de Philip Tetlock (autor de "Expert Political Judgment"), Silver divide os fazedores de previsões entre "porcos-espinhos" e "raposas".

Os porcos-espinhos creem em grandes ideias: a inevitabilidade disto, a preponderância daquilo. São personalidades alfa, que rendem excelentes frases na TV.

Já as raposas são ponderadas, detalhistas e usam várias pequenas ideias para formar opiniões cheias de senões. Embora não deem audiência, acertam mais que porcos-espinho, descobriu Tetlock ao analisar mais de 20 anos de previsões políticas.

Isso também ocorre na economia, com a desvantagem de afetar o resultado, já que o mercado reage a previsões.

Previsões sobre o PIB, diz Silver, deveriam vir com margem de erro, como as eleitorais. Segundo ele, previsões financeiras são melhores no longo prazo, em que só resistentes às intempéries lucram, do que no curto, em que fortunas são ganhas e perdidas num "tilt" de algoritmo.

Isso fica mais claro na era do "big data", em que, para acelerar lucros, corretoras fazem seus algoritmos monitorarem informações em tempo real para reagir automaticamente ao noticiário.

SUTILEZA PERDIDA

Em abril, por exemplo, hackers invadiram o Twitter da Associated Press, dizendo que um incêndio na Casa Branca teria ferido Obama. Em minutos, a Bolsa dos EUA perdeu US$ 136,5 bilhões. O tuíte era claramente falso para um ser humano, mas quem postou sabia que máquinas não têm essa sutileza.

É nesse ponto que Silver diverge da maioria dos autores recentes de livros sobre a sociedade dos grandes dados.

Kenneth Cukier e Viktor Mayer-Schönberger, em "Big Data: A Revolution that Will Transform How We Live, Work and Think", ressaltam que a explosão de dados tornará irrelevante a localização das causas. Descobrir que fatores aparentemente aleatórios andam juntos (o que computadores calculam bem) seria bom o bastante.

O problema é o risco de correlações espúrias, comuns no noticiário sobre pesquisas exóticas. Em 2009, uma pesquisa inglesa apontou que vaquinhas com nome dão mais leite do que vaquinhas anônimas. Saiu na BBC e foi republicado por milhares de sites ao redor do mundo.

A pesquisa levou o troféu Ig Nobel, concedido a quem ajuda a erigir o altar da "desnoção". O bom senso sugere que só conseguem batizar a Mimosa fazendeiros com poucas vaquinhas --que, assim, podem lhes dar tratamento personalizado. Num mundo em que meras correlações embasam toda decisão, essa sutileza se perde.


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