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Fã tímido, Nelson Pereira lembra Graciliano

Cineasta fala na Flip sobre adaptações de dois romances do alagoano, "Vidas Secas" e "Memórias do Cárcere"

Mesa em que também estará a cantora Miúcha foi uma das primeiras a ter ingressos esgotados; evento vai de 3 a 7/7

MARCO RODRIGO ALMEIDA DE SÃO PAULO

Toda conversa sobre Graciliano Ramos esbarra no cineasta Nelson Pereira dos Santos. E o inverso é mais do que verdadeiro.

Tem sido assim desde 1963, quando Pereira, 84, levou ao cinema uma dos clássicos do autor, "Vidas Secas" (1938). Quebrou na ocasião uma lei tão antiga e universal quanto os dez mandamentos: a de que livro bom rende filme ruim.

Vinte anos depois, repetiu a façanha, novamente com Ramos, ao adaptar o livro "Memórias do Cárcere" (1953). São os dois filmes mais famosos de Pereira, e, tal qual os livros que lhes serviram de base, dois marcos da cultura brasileira no século 20.

Graciliano e Pereira estarão ligados novamente na Festa Literária Internacional de Paraty (Flip). O escritor alagoano (1892-1953) é o homenageado do evento, que acontece de 3 a 7 de julho. No dia 5, o diretor participa de debate em que pretende abordar cinema, literatura e, é claro, Graciliano. A seu lado estará a cantora Miúcha, amiga de longa data e parceira em alguns de seus documentários.

A mesa foi uma das primeiras da Flip a ter ingressos esgotados: pouco mais de uma hora após o início das vendas, já não havia mais lugares. "Deve ter sido por causa da Miúcha", diz um Pereira modesto, por telefone, do Rio, onde mora.

Além das transposições das duas obras de Graciliano para o cinema, Pereira adaptou escritores como Nelson Rodrigues e Guimarães Rosa (veja ao lado). É o único cineasta a integrar a Academia Brasileira de Letras.

A literatura é a base de seu cinema, mas ele evita qualquer teorização sobre isso. "Sempre escolho pelo tema do livro. Gosto de fazer adaptações porque a história vem pronta. Já é meio caminho andado."

BALEIA

Graciliano e Pereira tinham amigos em comum e frequentavam os mesmos ambientes, mas nunca chegaram a se falar. O cineasta viu o autor uma única vez, em 1952, num almoço em homenagem a Jorge Amado, mas ficou tão encabulado diante do ídolo que não teve coragem de puxar conversa.

O contato mais intenso ocorreu por meio de carta, mais ou menos no mesmo período. Pereira pretendia levar à tela outro livro de Graciliano, "São Bernardo" (1934).

Queria autorização do autor para mudar o destino de Madalena, que se mata no fim do romance. Nelson ficara encantado com a personagem e queria um desfecho positivo para ela. Mas Graciliano não gostou da ideia e escreveu a ele uma carta assim arrematada: "Olha, se você quiser fazer o filme baseado no meu livro, tudo bem. Agora, se você quiser inventar uma história, faça a sua".

A relação artística começaria de fato uma década depois, com o escritor já morto. "Queria fazer um filme sobre a seca. Criei uma história original, mas era muito superficial. Aí lembrei de Vidas Secas', que tinha lido na adolescência."

As filmagens foram no sertão, em Palmeira dos Índios (AL), cidade em que o escritor morou e da qual foi prefeito. O mais difícil, diz, foi lidar com os bichos: papagaio, gado e, especialmente, a cachorra que "interpretava" Baleia.

A morte da cadela é um dos momentos mais impressionantes da literatura e do cinema nacional. "Foi muito difícil filmar. Só deu certo porque o [ator] Joffre Soares sabia conversar com os cachorros."

Pereira acalentou nos últimos 20 anos o projeto de um filme sobre outro de seus ídolos, o poeta Castro Alves, mas abortou a empreitada por causa de um orçamento salgado. Agora, tem outro livro na mira -- "D. Pedro 2º", do historiador José Murilo de Carvalho.


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