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Teatro

Ativismo em cena mira Apple e Steve Jobs

Texto com denúncias de uso de mão de obra ilegal na fabricação de eletrônicos na China terá montagem no Brasil

Peça do americano Mike Daisey, que não cobra direitos sobre a obra, será encenada por Cacá Rosset

GUSTAVO FIORATTI DE SÃO PAULO

Americano vai a Shenzen, cidade chinesa, finge ser um empresário, infiltra-se no ambiente de uma fábrica da Foxconn (maior produtora de eletrônicos do mundo), volta aos EUA e escreve uma peça denunciando maus tratos e emprego de mão de obra adolescente ilegal.

Essa é uma possível sinopse para um dos espetáculos mais controversos dos EUA dos últimos tempos, amplamente debatido por publicações culturais durante sua temporada, entre 2010 e 2012.

Com o título "A Agonia e o Êxtase de Steve Jobs", o texto chega ao Brasil pelas mãos de Cacá Rosset, diretor do Teatro do Ornitorrinco. Cacá pretende dirigir e atuar na produção, prevista para estrear entre o fim deste ano e o início do ano que vem.

Mike Daisey, o autor, não cobra pelos direitos autorais da peça, que foi criada para funcionar como ferramenta política, uma espécie de bandeira anticonsumismo. Ele contabiliza mais de 80 produções de seu texto ao redor do mundo, com traduções para seis línguas. Permite que seja feita qualquer adaptação: deixa transformar o conteúdo em musical, deixa inverter a ordem dos capítulos.

Em "A Agonia e o Êxtase de Steve Jobs", Daisey apresenta o testemunho pessoal de uma situação reportada também por revistas e jornais do mundo. Segundo ele, a Foxconn empregou na China trabalhadores abaixo da idade permitida por lei. Também submetia seus empregados a cargas horárias de até 16 horas, em um linha de produção descrita como insalubre.

Procurada pela Folha, a Foxconn diz conhecer a peça e suas denúncias. Sua assessoria de imprensa, no entanto, alega que muitas informações divulgadas pela peça são falsas ou são distorções.

Nos EUA, um programa de rádio chegou a pedir desculpas publicamente por ter transmitido parte do texto de Daisey. A retratação aconteceu após investigações de um repórter de Shanghai, Rob Schmitz, revelar que a peça continha alegações falsas.

DISTORÇÕES ASSUMIDAS

Mike Daisey já admitiu publicamente que havia feito distorções. À Folha, ele diz que a peça foi corrigida e que a versão apresentada atualmente (a mesma que será encenada por Cacá Rosset) não contém erros.

Daisey, no entanto, não abriu mão de uma informação crucial: ele insiste que entrevistou trabalhadores chineses abaixo da idade permitida pela lei do país.

"O monólogo disponível no meu site foi revisto após todos esses eventos. São revisões de apenas quatro minutos em um espetáculo de duas horas", defende-se.

A peça não é apenas sobre o modelo de produção da Foxconn. Existe no trabalho também um autorretrato satírico de um tipo comum nos EUA, o do sujeito viciado em tecnologia, admirador dos produtos da Apple (que são produzidos pela Foxconn).

Ao falar de si próprio, Daisey traça um perfil comicamente obsessivo. Pelo olhar desse nerd convicto, a peça chega ao ponto definitivo de sua investida, traçando um retrato de Steve Jobs (1955-2011), cofundador da Apple.

Há ainda, ao fundo de toda a história, uma percepção tipicamente americana da cultura chinesa e do universo que o autor encontrou andando pelas ruas de Shenzhen. Descrita por ele, a cidade tem semelhanças com o ambiente de "Blade Runner", com seus becos e seus néons.

É uma cidade que nos últimos 35 anos passou de pequena vila a metrópole com milhões de habitantes.

OUTRAS BANDEIRAS

"A Agonia e o Êxtase de Steve Jobs" é um tipo de teatro amarrado ao conceito de performance dos anos 1960 e 1970, algo que parecia ter caído no esquecimento, mas que tem sido resgatado pouco a pouco. Há outras bandeiras sendo levantadas por aí.

Em julho, por exemplo, a peça "Galvarino" passou por São Paulo debatendo a relação entre povos indígenas e o governo do Chile, a partir de caso real: um chileno de origem mapuche foi à Rússia e desapareceu. Os familiares pediram ajuda ao Ministério das Relações Exteriores, mas não obtiveram resposta.

No início de setembro, uma companhia inglesa pretende apresentar um espetáculo que engrossa o caldo da campanha contra a lei aprovada em junho na Rússia proibindo propaganda gay.


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