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Crítica - Poesia

Repetição de imagens e variedade de formas faz Garcia Lopes perder o vigor

O POETA UTILIZA AS FORMAS E OS ESTILOS --POR EXEMPLO, O POEMA PROVENÇAL OU A INVOCAÇÃO IORUBÁ DE UM ORIKI-- DE UM MODO LÚDICO E MESMO SEM COMPROMISSO

FELIPE FORTUNA ESPECIAL PARA A FOLHA

"Lunagens" é um poema de traços infantojuvenis: "A lua é um D, você não vê?/ Sobretudo quando míngua./ Ou quando enrola a língua,/ E vira um cílio prata, um C,/ Que no céu costuma se perder." Já "Litoral" é um poema concreto, enquanto "Agoridades" é um poema em prosa; e ainda há poemas respeitosos da métrica e da rima.

Esse conjunto bem diversificado foi reunido por Rodrigo Garcia Lopes em "Estúdio Realidade", quinto livro do poeta, tradutor e compositor, que assim interrompe o hiato de quase dez anos desde a publicação de "Nômada", livro de 1994.

Não existe, no volume, uma diretriz ou um princípio organizador que demonstre o alcance da proposital variedade do livro: o poeta utiliza as formas e os estilos --por exemplo, o poema provençal ou a invocação iorubá de um oriki-- de um modo lúdico e mesmo descompromissado, alternando humor, alusão e informação.

No entanto, essa mesma variedade não é jamais experimental: o poeta não ousa, ao escrever, ultrapassar os elementos já conhecidos daquelas formas e daqueles estilos. Ao exibir um domínio permeado de ironia, sua poesia chega mesmo a se repetir e, desse modo, perde vigor.

A imagem de um "pôr do sol salmão" aparece em três poemas ao longo do livro, mas não representa o fio condutor de alguma ideia.

Em "Na Hora do Mundo", um verso afirma que "Rimar é acordar os sons da sílaba" --mas se trata apenas de uma afirmação, em si mesma nada surpreendente, sem qualquer consequência para outros poemas de "Estúdio Realidade".

Porém, seguramente fascinado pelas rimas e pelas possibilidades de explorar as palavras, o poeta enfrenta em muitos dos seus poemas o desafio de tornar de fato consequentes as suas descobertas.

Em "Noites em Branco" se lê: "Ah, branca página,/ branca e pálida vagina,/ pele emudecida, papiro sem pátina/ onde a cena ainda se imagina/ e o mundo parece mágica." A aproximação sonora --sobretudo das palavras "página", "pálida", "vagina", "pátina" e "mágica"--não foi infelizmente capaz de exibir uma imagem poética forte: tudo se reduz ao lúdico e cria relações que podem até mesmo implicar com o assunto do poema.

Ao longo do livro é possível reencontrar o mesmo procedimento, que serve muito mal à força das metáforas, como em "V de Vingança": "Não quis abandonar a noite violenta/ Nem quando as trevas floriram trevos/ E o dia ejaculou sua negra mensagem/ Criando a outra dimensão do espaço."

Ou ainda, como no poema "Green Flash", a expressão de uma impotência que pode explicar a obsessão do autor pela variedade: "Vida, você me deu tanto/ não tenho como retribuir."

A IMAGEM DE UM "PÔR DO SOL SALMÃO" APARECE EM TRÊS POEMAS AO LONGO DO LIVRO, MAS NÃO REPRESENTA O FIO CONDUTOR DE ALGUMA IDEIA


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