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Análise

Fauzi era um artista preciso e temperamental

Diretor teatral, que morreu na quinta, era gentil, mas explosivo; para um ator, era uma dádiva ser eleito por ele

Ele ficava possuído quando tentava explicar algo que queria para a cena e não conseguia que o entendessem. Meia hora depois ele voltava e era delicado com todos

MÁRIO BORTOLOTTO ESPECIAL PARA A FOLHA

São José do Rio Preto. 1991. Ele havia acabado de assistir ao nosso espetáculo. Era "Inimigos de Classe" do Nigel Williams, uma peça punk sobre um grupo de garotos que expulsam o professor da sala de aula.

Fauzi Arap me encontrou no saguão e disse que um dia ia querer trabalhar comigo.

Ele não precisava se apresentar. Eu sabia quem ele era. Balbuciei timidamente que era só ele chamar. Ele sorriu. E cinco anos depois ele realmente me chamou.

Vim a fazer "Frida Kahlo" sob sua direção, mas ele tinha planos maiores.

Fauzi queria mesmo era que eu interpretasse o Arthur de "Santidade", texto inédito do Zé Vicente que ele deveria ter feito como ator na época que foi censurado.

Ele me escolheu para interpretar o personagem que o impediram de fazer. E, para um ator, ser escolhido pelo Fauzi era mais que um prêmio, era uma espécie de dádiva.

Eu devo a ele o pouco que sei sobre a arte de dirigir atores. Ele era preciso e exato.

Vê-lo dirigindo e entrando no palco e fazendo a cena (ele era um ator formidável que desistiu por não gostar de ficar em evidência como a profissão exige), para que você entendesse como devia ser feita, é algo que eu teria que viver mais cinco vidas para pensar em ter de novo algo parecido.

Ele ficava possuído quando tentava explicar algo que queria para a cena e não estava conseguindo que o entendessem, se impacientava, saía irritado e ameaçava não voltar mais.

A gente sabia que devia sentar e esperar. Meia hora depois ele voltava e nos chamava pra tomar um café e era extremamente delicado com todos.

Era sempre assim. Era o seu amor incondicional pela sua arte e pelos afortunados que elegia.

FURACÃO

Quem o via extremamente gentil no trato diário não conseguia conceber o furacão que ele era.

Era um artista meticuloso e perfeccionista, amoroso e parceiro, o que não o eximia de ser explosivo e temperamental quando sentia que era necessário.

Depois de dirigir a cena, ele costumava me dizer: "Tá ótimo, Mário, mas agora suja um pouquinho a marca pra não parecer que é marca".

Nunca haverá outro diretor como o Fauzi.

Quando ele nos propôs um workshop no Festival de Teatro de São José do Rio Preto, ocasião em que nos conheceu, Ademar Guerra (outro diretor genial e lendário) saiu falando alto enquanto se despedia do nosso grupo: "Vocês não sabem o que estão ganhando".

Com o meu amigo Fauzi, eu ganhei muito mais do que merecia.


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