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Crítica romance

'Lionel Asbo' é um desafio, experiência literária sublime com ares de nonsense

SANTIAGO NAZARIAN ESPECIAL PARA A FOLHA

Sarcasmo, cinismo e ironia são recursos de estilo difíceis de serem traduzidos por aqui. Não apenas porque não encontram muita correspondência num país pretensamente simpático como o nosso, mas porque dependem de antemão de uma compreensão do leitor, uma cumplicidade, tornando-o aquele que também caçoa ou aquele que é caçoado.

Esse jogo está em alta em "Lionel Asbo: Estado da Inglaterra", a começar pelo título, com um intraduzível "Asbo" (de "ordem de comportamento antissocial", em inglês) e um "State of England", que nem em português deixa claro se se refere ao estado atual da Inglaterra ou a um fictício "Estado" do Reino Britânico.

Um pseudo-fictício momento atual da Inglaterra é o que encontramos no romance de Martin Amis. Desmond é um jovem criado nos subúrbios de Londres pelo marginal tio Lionel, um antipai, ou contrapai ("Lionel falava; Des ouvia com atenção e depois fazia outra coisa") que recomenda que ele falte na escola, só leia porcaria e só use o computador para pornografia.

Contrariando a educação familiar, Desmond, gentil, feminista e "romântico", segue um progresso lento e constante através dos estudos, enquanto seu tio avança loucamente pelo crime e pela sorte, tornando-se uma celebridade instantânea ao ser premiado num bilhete de loteria.

A estrutura do romance é ousada, não só oscilando entre os dois personagens, como também incorporando reportagens e desconstruindo a linearidade, mas sempre oferecendo a possibilidade do leitor de rir daquilo como uma grande piada, um traço da boa literatura pop que não parece existir entre nós.

O teor imoral do caráter de Asbo (que afinal é o herói do romance) e seu comportamento violento poderiam tornar o romance pesado.

Mas sua completa inversão de valores toma ares de nonsense, como nos melhores filmes de Tarantino, e oferece um desafio ao leitor na voz do protagonista: "O mundo dos ricos é pesado. Tudo tem peso. Porque está aqui para durar. E o meu velho mundo... é leve! Nada pesa um grama! As pessoas morrem! As coisas... voam e desaparecem! Portanto este é o meu desafio. Ir do mundo flutuante... para o mundo pesado. E sou capaz de enfrentá-lo."

Lionel Asbo é um desafio. Uma experiência literária sublime, mas produto da Inglaterra, que talvez perca grande parte de sua força em outros territórios, reinos e Estados.


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