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Crítica - Teoria literária

Pesquisadora defende extinção da invenção na poesia do século 21

Marjorie Perloff destaca a apropriação e a cópia no lugar da originalidade em livro com textos pouco áridos

O 'GÊNIO ORIGINAL' PRECONIZADO PELA ESTÉTICA ROMÂNTICA ESTARIA DEFINITIVAMENTE EXTINTO

RODRIGO GARCIA LOPES ESPECIAL PARA A FOLHA

Em seu mais recente livro lançado no Brasil, a crítica americana Marjorie Perloff defende que um elemento central na poesia do século 21 é o trabalho literário feito por meio de apropriação, citação e colagem de textos alheios.

Na era digital, imerso em "um ambiente de hiperinformação" e onde todos são autores em potencial, o "gênio original" preconizado pela estética romântica estaria definitivamente extinto.

O poeta hoje seria menos um escritor e mais um reescritor, que se apropria dos textos espalhados pelo ambiente, reorganizando e editando-os em novos contextos. Perloff ampara sua tese com exemplos de predecessores modernistas como "A Terra Devastada", de T.S. Eliot, e "Os Cantos", de Ezra Pound, mas sobretudo em "Passagens", de Walter Benjamin.

Paradoxalmente, o "novo" agora se dá pelos meios peculiares com que os poetas reciclam e justapõem materiais preexistentes. "A invenção está dando lugar a apropriação", declara a crítica.

No entanto, "apropriação, citação, cópia, reprodução" são práticas textuais tão antigas quanto a própria literatura, e ela obviamente sabe disso. Se, por um lado, a ideia de originalidade é uma invenção relativamente recente, a apropriação de outros autores e textos sempre existiu.

Também há exemplos, em outros séculos, de obras feitas totalmente de citações (como nos florilégios medievais), ou onde os limites entre tradução e criação eram borrados, ou a poesia era composta de fragmentos de várias línguas (como a poesia macarrônica).

O mérito de Perloff é fazer certos textos parecerem menos áridos e "ilegíveis" do que são. Discute a obra dos poetas concretos brasileiros Augusto e Haroldo de Campos, do japonês Yoko Tawada, da franco norueguesa Caroline Bergvall, entre outros.

O capítulo dedicado à poesia concreta é importante por seu resgate no contexto da poesia digital, mas parece algo deslocado da tese central do livro, já que citação, colagem e apropriação não foram os paradigmas centrais abraçados pelo grupo Noigandres.

O controverso Kenneth Goldsmith surge como o "gênio não original" central do argumento. Em uma obra "extrema" como "Solilóquio" ele transcreve cada palavra que pronunciou em uma semana.

Resta saber se, numa obra onde mais vale o conceito (a ideia) do autor do que os textos resultantes, estes se qualificam ou não como poesia.

Qual o preço, para a poesia, desse descarte de qualquer possibilidade lírica, emocional, criativa e expressiva? Talvez a resposta seja dada pelo próprio Goldsmith quando provoca, em entrevista: "A melhor coisa a respeito da poesia conceitual é que ela não precisa ser lida".


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