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Festival de teatro atrai público com tabus

MITsp, que terminou no domingo, recebeu 14 mil pessoas em peças que discutiam sexo, religiosidade e ditadura

Com 11 dias de duração e ingressos gratuitos, a primeira edição do evento paulistano teve filas de até dez horas

GUSTAVO FIORATTI DE SÃO PAULO

Filas de até dez horas carimbaram a primeira edição da Mostra Internacional de Teatro de São Paulo (a MITsp), com saldo negativo para quem frustrou-se com muitas tentativas em vão.

É verdade que este pontapé inicial da mostra seria um teste para seus próprios limites. E a primeira edição encerrou-se no domingo deixando a impressão de que a curadoria do evento subestimou seu potencial. Detalhe: os ingressos eram gratuitos.

Catorze mil pessoas compareceram aos espetáculos e à programação pedagógica. Para efeito de comparação, a última edição da Mostra Internacional de Cinema de São Paulo --em duas semanas contra nove dias da MIT-- teve participação de mais de 200 mil pessoas. Os organizadores da MIT dizem que não esperavam tanta gente.

A conta errada foi numérica, mas chama atenção para outra questão. A MITsp, em seus primeiros passos, também abriu mão de um formato muito presente em festivais: não mexeu com a rua, não apresentou espetáculo ao ar livre, não interveio no espaço urbano com trabalhos que, por gênero, acabam abarcando o público desabituado a frequentar salas.

A opção de ocupar apenas teatros contrasta com a trajetória do curador Antonio Araújo, encenador que dedicou sua carreira a intervenções em edifícios e espaços da cidade (ocupou presídio, igreja, hospital, o leito do rio Tietê, as ruas do Bom Retiro).

OPINIÕES

A MITsp reinaugurou a possibilidade de debater o teatro antes e depois das sessões,diante de temas fortes (abuso sexual, religião, regimes ditatoriais). "O que você viu? Do que você gostou?" Eram perguntas frequentes. O público pôde comparar e compartilhar opiniões.

Os curadores afirmaram que o norte da mostra era o cruzamento de disciplinas e de suportes, bem como um olhar sobre criações radicais. Não é mais possível pensar o teatro de forma diferente. As questões trazidas pelos 11 espetáculos não são especialmente frescas. São parte de um cenário que se estilhaçou.

Por isso, os temas, os textos, os tipos de dramaturgia, fecharam, sim, um plano fundamental da mostra, vibrando na mesma medida das questões relativas aos suportes e ao cruzamento de campos de expressão (música, artes visuais, cinema).

Se a curadoria quis afastar focos temáticos, contraditoriamente, um posicionamento prevaleceu: o olhar para as frestas e os atritos entre o sacro e o profano como janelas para questões de ordem íntima e políticas demarcaram território com força.

A imagem de Jesus ao fundo da cena do espetáculo "Sobre o Conceito de Face no Filho de Deus", do italiano Romeo Castellucci, pareceu prenunciar na abertura da mostra que Ele estaria presente em quase tudo, como a cruz de um sentimento latino.

O tema retornou com força em "Gólgota Picnic" e em "Eu Não Sou Bonita" e teve pinceladas em outros trabalhos.

As peças sobre regimes políticos repressores também criaram um eixo temático fechado, dos quais fizeram parte "Escola", do dramaturgo chileno Guillermo Calderón, e "Ubu e a Comissão da Verdade", dirigida pelo sul-africano William Kentridge.

Os dois eixos temáticos encerram um olhar da MITsp em crises que há muito tempo são contemporâneas. Enfrentaram essas questões na mesma medida em que as perpetuaram. Ubu até sugere, em sua fábula: que tal resolver tudo isso e depois olhar para frente? Difícil será esquecer.

Assim, a MITsp parece dizer que ainda é fundamental olhar para trás, examinando pesadelos do passados ainda presentes. "Gólgota Pinic" e "Sobre o Conceito...", por exemplo, provocaram protestos na França. Sim, fica a estranha sensação de século 20.


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