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Alemanha debate reeditar livro de Hitler

Memórias do ditador nazista caem no domínio público no começo de 2016, mas controvérsia já está aberta no país

Baviera detém os direitos autorais de 'Minha Luta'; acadêmicos preparam edição comentada

BEATRIZ MONTESANTI DE SÃO PAULO FABIO VICTOR EDITOR-ADJUNTO DA "ILUSTRADA"

O livro de memórias de Hitler, "Mein Kampf" ("Minha Luta"), que ajudou a difundir o nazismo, entrará em domínio público na Alemanha em janeiro de 2016, permitindo sua publicação sem pagamento de direitos autorais.

Mas o tema já movimenta o país, com autoridades debatendo o que fazer para impedir o mau uso da obra.

O governo da Baviera --que detém os direitos desde que Hitler morreu, sem herdeiros-- investiu 500 mil euros (cerca de R$ 1,6 mi) em uma edição comentada, preparada pelo Instituto de História Contemporânea de Munique.

Acadêmicos alemães defendem a edição comentada como alternativa a leituras equivocadas ou exaltação à obra.

"Os leitores de hoje não estão familiarizados com muitos eventos políticos dos anos 1920 aos quais Hitler faz referência. Os comentários podem ser aplicados a palavras e expressões assim como à política e à ideologia nazistas", disse à Folha a historiadora alemã Edith Raim, uma das responsáveis pela versão.

Em dezembro o projeto quase veio abaixo. Políticos alegaram que não era "tarefa do Estado difundir a propaganda nazista", segundo disse a secretária de assuntos externos do governo bávaro, Christine Haderthauer.

Após debate intenso no parlamento estadual, o secretário da Cultura, Ludwig Spaenle, declarou que "não se pode atentar contra a liberdade científica" e que "o Instituto poderia publicar a obra por sua responsabilidade".

Segundo Raim, a versão continua a ser feita e estará pronta para ser publicada assim que os direitos autorais do livro expirarem.

Depois disso, o governo alemão poderá lançar mão do Código Penal, que criminaliza a incitação ao ódio racial, para impedir publicações do texto que julgar indevidas.

Para a historiadora da USP Maria Luiza Tucci Carneiro, a justificativa de que uma nova edição comentada evitaria publicações financiadas pela extrema-direita é ingênua. "O fato de os direitos autorais expirarem não quer dizer que as ideias racistas ali editadas tenham sua validade vencida. Uma reedição continuará incitando ódio a judeus e outras minorias", afirma.

"Embora a obra esteja na internet, o texto publicado tem um padrão de legitimidade que o texto on-line ainda não tem simbolicamente", diz a antropóloga da Unicamp Adriana Dias, que pesquisa o comportamento de neonazistas brasileiros na rede.

Além das versões na web, edições antigas são facilmente encontradas em sebos e bibliotecas. Na rede on-line Estante Virtual, uma versão de "Minha Luta" vai de R$ 40 a R$ 8.400.

Uma que se diz em alemão gótico, com "foto e assinatura impressa de Hitler" custa R$ 2.800. Outra, com uma "insígnia do nazismo de ouro", é oferecida por R$ 8.400.

Para defensores da publicação da obra no Brasil, impedir o acesso é um atentado à liberdade de expressão.

"Duvido que o cara vá ler o livro e virar nazista, a não ser que já seja. Quem compra é para folhear", diz o advogado Alexandre Pires, que vende e-books em inglês da obra pela editora Montecristo.

"É como ter uma loja de roupas sem a cor amarela só porque você não gosta dela", diz Adalmir Caparrós Fagá, sócio da editora Centauro, que publicou o livro até 2008.

Na Alemanha, o livro está disponível em bibliotecas e pode ser consultado no local, para fins acadêmicos.

Quatro bibliotecas de São Paulo têm unidades do livro em catálogo, pouco consultadas nos últimos anos (48 empréstimos desde 2009).

Promotor da cultura alemã, o Instituto Goethe informou que "se recusa a disponibilizar esta publicação em suas bibliotecas" e que o livro só deve ser apresentado "no âmbito de seminários ou eventos de informação".


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