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Crítica disco

Disco explora a suave tensão entre Gilbertos Gil e João

LUIZ FERNANDO VIANNA COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Em meados dos anos 1960, quando iniciou a carreira, Gil queria ser João, mas ainda não era Gilberto.

O jogo de palavras no título do novo CD de Gil,

"Gilbertos Samba", é para dizer o seguinte: a graça do plural "Gilbertos" está na constatação de que a fusão, hoje, não é subserviência ou aniquilação. É soma.

O aprendiz não quer copiar o mestre, como possivelmente faria há 50 anos, mas explorar a suave tensão entre o que existe de João em Gil e o que pode existir de Gil em João.

Em 1979, no disco "Realce", Gil revestiu de pop "Marina", canção de seu outro mestre, Dorival Caymmi. Impôs uma de suas muitas facetas a uma obra pouco permeável a esse tipo de, argh, "releitura".

O resultado foi desastroso. Gil, no momento mais radical de sua metamorfose ambulante, ainda nem era totalmente Gilberto e queria relativizar o absoluto Dorival.

Em relação a João, ele poderia ter sido até conservador e realizado um trabalho voz-e-violão, como fez em "Gil Luminoso", um dos mais belos discos brasileiros.

Mas se aliou a músicos jovens, como Domenico Lancellotti e Rodrigo Amarante, para passear nas dobras dos Gilbertos. É significativo que a produção esteja a cargo de Bem Gil e Moreno Veloso. São os filhos de Gil e Caetano visitando o "avô" com olhos e ouvidos bem abertos.

No CD, a percussão e as palmas por vezes entram nos contratempos dos sambas, destacando um aspecto que, no todo violão-e-voz que é João, torna-se impossível de se destacar.

O dedilhar do violão solista de Gil e seus vocais não verbais surgem leves, sem agredir a estética de João com sons que lhe são estranhos, mas sem esvaziar a identidade do discípulo.

Nas divisões das palavras, Gil cita João explicitamente, como não poderia deixar de ser em se tratando de um pilar da invenção do baiano de Juazeiro. Mas deixa sobrar um agudo aqui e acolá, prolonga notas mais do que o mestre faria, dialoga nos detalhes, baixinho, com a matriz.

"Desde que o Samba É Samba" e "Eu Vim da Bahia", não por acaso de Caetano Veloso e do próprio Gil, ressurgem retrabalhadas à luz do que João fez com elas. Têm novos efeitos sonoros, estão no avesso do avesso do que eram, mas ainda assim estão mais coesas.

Em "Tim Tim por Tim Tim" e "Doralice", para ficarmos só em mais dois casos, o cantor e violonista esboça um sambaião de uma nota só, superpondo João e Luiz Gonzaga, fundindo João e Gil.

O fundo de samba-de-roda na faixa final "Gilbertos" conclui a missão de retornar às origens para seguir em frente.

GILBERTOS SAMBA
ARTISTA Gilberto Gil
GRAVADORA Sony
QUANTO R$ 30, em média
AVALIAÇÃO ótimo


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