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Rolo sádico

Com 12 m de comprimento e mais de 600 cenas de sevícias e perversões sexuais, o original '120 Dias de Sodoma', de Sade, foi comprado agora por um milionário; siga a história desse manuscrito mítico que, em mais de 2 séculos, foi censurado, escondido, perdido, achado, roubado, recuperado...

GRACILIANO ROCHA COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, EM PARIS

Na noite de 3 de julho de 1789, quando Paris ardia em processo revolucionário, Donatien Alphonse François de Sade, o Marquês de Sade (1740-1814), foi arrancado de sua cela na Bastilha e levado ao hospício de Charenton.

Sade abandonou um rolo de 12 metros de comprimento: "120 Dias de Sodoma ou a Escola de Libertinagem", seu texto mais visceral.

O autor morreu acreditando que o manuscrito tinha sido destruído com a Bastilha.

Mas o papel com sua letra cursiva foi comprado há duas semanas pelo francês Gérard Lhéritier por 7 milhões de euros (cerca de R$ 21 milhões).

É só o capítulo recente na aventura de um texto que foi escondido, perdido, reencontrado, profanado, roubado e recuperado ao longo de mais de dois séculos. "É um manuscrito mítico da literatura francesa, roubado e tirado da França. Agora, voltou para ficar", disse Lhéritier à Folha na última quinta, em Paris.

"120 Dias de Sodoma" é a história de quatro aristocratas em um castelo na Floresta Negra que, em um inverno, submetem 42 meninas e meninos a sevícias e perversões sexuais. São descritas mais de 600 cenas de abusos.

Foi nessa selvageria que Pier Paolo Pasolini (1922-1975) achou a inspiração e a metáfora para filmar "Saló ou os 120 Dias de Sodoma" (1975), que trata do fascismo.

Cumprindo pena por vários crimes, como sodomia, Sade criou o texto entre 1782 e 1785 e o escondeu entre as pedras da cela. Após a queda da Bastilha, o rolo foi achado e vendido à família do marquês Villeneuve-Trans, que o guardou por três gerações.

IDAS E VINDAS

O manuscrito foi vendido no fim do século 19 ao médico alemão Iwan Bloch e publicado pela primeira vez em 1904, sob pseudônimo, com erros de transcrição.

Foi recomprado por descendentes de Sade em 1929 e ganhou a primeira edição francesa dois anos depois. Para evitar censura, a edição era destinada só a bibliófilos.

Em 1982, uma descendente de Sade, Nathalie de Noailles, emprestou o original ao editor Jean Grouet, que prometeu estudá-lo. Meses depois, ele devolveu o estojo vazio: vendera o rolo ao colecionador suíço Gérard Nordmann por 300 mil francos.

Aí começou a batalha judicial. A França incluiu o rolo na lista de obras roubadas da Interpol. Uma corte suíça concluiu que Nordmann adquiriu o original de boa-fé.

O acordo para a volta do original à França levou três anos e foi conduzido por Lhéritier, negociante de documentos raros. Ele pagou tanto à família Nordmann quanto aos descendentes de Sade em troca do texto e do encerramento das ações.

No dia 25 de março, seu jato particular voou de Genebra a Paris com o documento. O milionário, agora, pede a inscrição do manuscrito como tesouro nacional francês.


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