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Crítica - Música

Presença de Roberto é a essência de show

Em temporada em SP, Rei mostra voz intacta e repertório passional, cheio de clichês; mas importa o 'eu estou aqui'

SIDNEY MOLINA CRÍTICO DA FOLHA

"Emoções" abriu o show de Roberto Carlos sábado no Espaço das Américas, em São Paulo. É uma canção metalinguística, que parte da presença física do artista para declarar uma profissão de fé.

A tessitura do canto raramente passa de uma oitava, mas a voz está intacta, o que o coloca ao lado de Caetano Veloso, Ney Matogrosso e poucos outros de sua geração.

O timbre na região entre dó e ré no centro do piano é claro e bonito. Em geral canta um tom abaixo das gravações dos anos 1970, o que diminui o brilho, mas não chega a descaracterizar as músicas.

Na extrema esquerda do palco, duas eficientes filas de três sopros (trompetes e trombones ao fundo, saxofones à frente); a cozinha no centro (percussão e bateria atrás, mais o piano de Eduardo Lages, baixo, guitarra e violão); do lado direito, o discretíssimo trio vocal e teclado.

Uma vez Augusto de Campos escreveu que o modo de cantar de Roberto era mais próximo do de João Gilberto do que este de Elis Regina (1945-82). Realmente, a retórica da fala é essencial em suas canções, mas ele também sabe evocar a passionalidade, sabe quais são suas notas "boas" --e sabe usá-las.

Em Roberto, compor canções nem sempre é um artesanato bem-sucedido. Incomoda, às vezes, o fato de os versos serem invariavelmente curtos e pontuais; e como a música tem os seus rigores, sobra um espaço vazio no meio, nem sempre bem preenchido pelo arranjo.

Ao vivo, porém, essa suposta fraqueza às vezes vira força: a composição não se separa do fato de ele estar ali, dizendo as coisas com as hesitações do momento. Essa é a minúcia de "Detalhes", embora o recurso funcione menos em "O Portão".

Roberto Carlos cantou muito bem "Desabafo" e "Outra Vez" --solto no tempo, sem exagero; nelas, a arte da interpretação supera a composição. E em "Negro Gato" e "Ilegal, Imoral ou Engorda", bastam o humor e a energia dos anos 1960.

Por outro lado, tudo em "Lady Laura" --do título às convenções no sax-- é de mau gosto; "Mulher Pequena" é um acúmulo de clichês; e "Nossa Senhora" é fraca, longa e arrastada. Com o sabor dos musicais dos anos 1970, "Jesus Cristo" é bem melhor, apesar da prosódia torta --"Jêsus"-- incomodar alguns ouvidos (não incomoda este crítico).

Quando chegou esse momento, no entanto --tendo passado por "Champagne", de Peppino di Capri, com direito a espumante servido à plateia--, Jesus foi logo esquecido: na hipnose do fanatismo, sobrou apenas o "eu estou aqui".


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