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Crítica romance

Silêncio funciona bem como expressão da tortura em narrativa

'História Policial', do húngaro Imre Kertész, retrata a repressão em um país imaginário da América do Sul

LUIZ BRAS ESPECIAL PARA A FOLHA

Em 1977, quando o escritor Imre Kertész publicou por uma editora estatal sua breve "História Policial", a Hungria ainda era um satélite da União Soviética.

Causa espanto que o romance tenha sido liberado pelos censores da ditadura socialista. Afinal, nele o autor denuncia as atividades brutais de um partido político que chegou ao poder de modo ilegítimo.

A narrativa trata claramente da Hungria ocupada. Mas, para driblar a censura, Kertész transferiu a trama para um país imaginário da América do Sul.

Simples assim, e os censores engoliram. Ou eram rematados patetas ou já intuíam a queda do império soviético e ficaram satisfeitos com o subterfúgio geográfico que salvava as aparências.

"História Policial" narra o sequestro e a tortura de Federico e Enrique Salinas, pai e filho, pelos agentes do demoníaco Departamento, órgão de repressão do governo.

Para fugir do tédio da vida confortável, Enrique planejava se juntar a um grupo de resistência à ditadura. Mas faltou-lhe o mínimo de astúcia. O idealismo impulsivo do rapaz seria a ruína também de seu pai.

Ficamos conhecendo detalhes do infortúnio dos Salinas por meio do ex-agente Antonio Martens, um de seus torturadores.

Martens está preso. O partido ao qual servia foi derrotado. É na cadeia que ele escreve sua história, com base em um diário de Enrique.

Martens não descreve as sessões de tortura. À expressão crua da violência Kertész prefere a sugestão e a elipse. Funciona.

Difícil não ficar arrepiado com essa observação sinistra do ex-agente: "Durante os interrogatórios, entre as palavras estão os silêncios. Desses silêncios é que eu menos gosto. Porque nunca são silêncios absolutos. Estão cheios de pequenos ruídos característicos".

Os gemidos e suspiros --o verdadeiro som dos torturados--, é disso que Martens se queixa: "Mesmo que me achem um maníaco, o que eu menos aguento são esses silêncios".

Imre Kertész recebeu o Nobel de literatura em 2002. "História Policial" é seu quinto livro lançado no Brasil.


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