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Crítica - Romance

Autor mostra virtuosismo em ficção sobre Brasil dos anos 50

Sofisticado, 'Montanha', de Cyro dos Anjos, causa certo cansaço ao leitor

ADRIANO SCHWARTZ ESPECIAL PARA A FOLHA

Em seu bom posfácio a esta nova edição de "Montanha", Roberto Said lembra a carta que seu autor, Cyro dos Anjos, escreveu, em 1954, para Carlos Drummond de Andrade antes da publicação do livro.

O escritor estava preocupado com a recepção da obra e dizia ao amigo: "Sem ser um romance à clef aproveitou largamente do ambiente histórico e de caracteres de nossa fauna política --o que talvez desaconselhe a publicação agora".

Passados quase 60 anos --o livro saiu de fato em 1956--, talvez o problema tenha se invertido e a compreensão desta ficcionalização dos eventos políticos do Brasil nos anos 1950 passe exatamente pela medida de quanto a narrativa se sustenta agora, tão distante dos acontecimentos que a motivaram.

Há, por um lado, um evidente exercício virtuosístico de trabalho com o texto, com um uso sofisticado de narradores múltiplos, de contrapontos, de vozes originadas a partir das mais diversas fontes (diários, programas de rádio, anotações taquigráficas), de diluição das percepções de verdade, exercício que remete a experimentos similares feitos por uma série de autores centrais do período.

Por outro lado, do ponto de vista da trama, sem o efeito de sentido mais imediato propiciado pela comparação e contraste com os fatos e personagens "reais" (o livro teve amplo sucesso em 1956, quando foi lançado), resta ao leitor um certo cansaço para acompanhar as peripécias de Pedro Gabriel, sua mulher, suas amantes e seus adversários em meio às batalhas de poder de um universo político provinciano, violento e mesquinho (nisso, admita-se a profunda atualidade da obra!).

Cyro dos Anjos (1906-1994) é autor de apenas três romances e, se tivesse escrito apenas o primeiro, "O Amanuense Belmiro" (1937), já teria lugar de destaque em nossa literatura.

Aqui, em "Montanha", talvez falte, paradoxalmente, um pouco da "síntese poética" a que o protagonista alude logo no início do texto: "Memória imprestável que só retém das coisas a síntese poética! Boa decerto para artistas, que vivem no fictício. Ao político, homem que tem de se avir com o concreto, é simplesmente calamitosa".


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