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Crítica - Memórias

Criadora de 'Girls' comove ao expor os seus percalços

Quem viveu amor imperfeito quer dormir de conchinha com livro de Lena Dunham

TATI BERNARDI COLUNISTA DA FOLHA

Lena Dunham amargou bons anos de sexo "errado". Namorando garotos que ou não tinham muito tesão em seu corpo ou "curtiam a dinâmica do desrespeito".

Seu livro "Not That Kind of Girl" (previsto pela Intrínseca para novembro como "Não Sou uma Dessas") tem um tom de "olha, deixa eu te contar tudo o que passei, pra ver se te faço sentir menos idiota com sua vida ou, pelo menos, te protejo de não fazer as mesmas burradas que eu".

Se me emocionei com suas 288 páginas da mais pura sinceridade ("A pior coisa que você pode dizer a um amigo é que escreveu um capítulo sobre ele, a segunda pior é que não escreveu nada sobre ele"), autoironia ("Eu estava desempregada e comia como se ganhar peso pudesse ser uma profissão viável") e exposição (suas palavras incomodam como sua personagem Hannah no seriado "Girls": precisa de tanta nudez?), imagino o que o livro não deve causar numa garota de 20 e poucos anos.

A urgência e a dramaticidade com que Lena narra seus percalços da infância à vida adulta (se dedicando com ainda mais urgência e dramaticidade aos tempos de colégio) fazem parecer que namorar, ter amigos, conviver com a família, trabalhar e se ver no espelho são as coisas mais terríveis do mundo.

Algo comparável a lutar numa guerra ou ser preso por engano. E quer saber? Considerando que ela nunca conseguia beijar ninguém nas festas, que sua irmã era chique e magra enquanto Lena era... bom, a menina que vocês podem ver no seriado da HBO, que foi obrigada a viajar a um acampamento natureba sem ter nenhum amigo na escola (e vomitou na frente de todo mundo) e que, já adulta, foi demitida de uma loja de roupas infantis por vender o número errado a Gwyneth Paltrow, molestada por um chefe (que passou a mão na sua bunda) e violentada por um namoradinho (e ela só foi notar no dia seguinte), acho que dá pra entender.

Se existisse uma igreja de neuróticos, Lena já teria virado estátua (santa pega mal dizer). Ela perseguiu seu analista, obcecou em um "date" virtual que jamais conheceu (e que sumiu alegando "morte", fazendo-a abraçar um luto bizarro que os pais jamais compreenderam), se sente ameaçada por "um câncer provável", pensa obsessivamente na própria morte (em especial quando vivencia momentos de aparente felicidade com alguém aparentemente bacana), tem medo de uma síndrome que sobrecarrega as glândulas e que ela chama de "exaustão causada por uma vida moderna e ambiciosa" (googlei rapidinho e tive medo também) e não acredita ter língua e útero normais.

Todas as mulheres do mundo que já acharam seus corpos errados o suficiente para merecerem um amor imperfeito vão mais do que se identificar: vão ter vontade de dormir de conchinha com esse livro. E se você for (ou conhecer) uma mulher que nunca se desprezou o suficiente para se enfiar numa história nojenta, por favor, não conte a ninguém. A história não terá graça nenhuma.


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