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Crítica / Drama

Encenação de tragédias de Ésquilo é dos fatos mais notáveis do teatro neste ano

LUIZ FERNANDO RAMOS CRÍTICO DA FOLHA

Quando o mínimo é o máximo. A encenação pelo Club Noir das sete tragédias que restaram de Ésquilo (525 a.C.-456 a.C.) é um dos fatos mais notáveis do teatro brasileiro neste ano.

Restringidos e ambientados em um mesmo cenário, na adaptação do dramaturgo e encenador Roberto Alvim, aqueles textos milenares reaparecem com estranho frescor e dialogam provocativamente com a arte contemporânea.

Ésquilo é o fundador da dramaturgia ocidental. São seus os textos mais antigos de que se tem notícia do chamado período clássico grego, no século 5 a.C. Deixou entre 70 e 90 tragédias, das quais apenas sete chegaram até nós: "As Suplicantes", "Os Persas", "Sete contra Tebas", "Prometeu Acorrentado" e a trilogia Oresteia.

Esta inclui "Agamenon", "Coéforas" e "Eumênides", e foi sintetizada pelo Club Noir em duas encenações: "Oresteia 1" e "Oresteia 2".

Na adaptação desse conjunto, Alvim utilizou um mesmo procedimento redutor. Subtraiu todos os elementos mitológicos, tradicionalmente associados às tramas em curso, e minimizou o papel do coro, diluindo sua função narrativa. As falas desobrigam-se de contar histórias e tornam-se substantivas, soando como poemas inaugurais.

A operação constritiva no texto refletiu em todas as montagens, com dispositivos cênicos comuns e procedimentos de atuação que enfatizam a enunciação em detrimento da narração.

Os atores estão quase estáticos e invisíveis. Potencializados como emissores, resgatam o que há na obra de Ésquilo de oracular sobre a condição humana.

A constrição se consubstancia também no espaço cênico. Citando a tela "Quadrado Negro", do pintor russo Kazimir Malevich (1878-1935), pintada em 1915, Alvim criou um cubo inteiramente vazado e iluminado só por uma fonte de luz fluorescente. É este vazio em chiaroscuro que as falas habitam e onde se entrechocam. Os atores entram e saem lentamente dele, constituindo vozes agentes que instauram presenças.

Isto demandou do elenco atrair todas as atenções para seus enunciados, assumindo por vezes distintas dicções e tons numa mesma frase. A responsável pela proeza é Juliana Galdino, atriz com extraordinário domínio vocal, e que preparou o elenco para realizar as seis montagens com esta mesma qualidade na atuação.

"Peep Classic Ésquilo" era um projeto ambicioso que, realizado, aproxima o teatro da grande arte. Demarca na trajetória do Club Noir um momento culminante, e na cena atual, não só brasileira como internacional, um gesto de extrema radicalidade.


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