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Livro relata morte de militante amigo de Dilma Rousseff

Autora Cristina Chacel resgata história de Carlos Alberto, o Beto, que dirigia a VAR-Palmares e desapareceu

ELEONORA DE LUCENA DE SÃO PAULO

Carlos Alberto Soares de Freitas desceu de um ônibus na avenida Princesa Isabel, em Copacabana, na manhã de 15 de fevereiro de 1971. Tinha 31 anos e dirigia a VAR-Palmares, grupo de resistência à ditadura. Era conhecido como Beto, codinome Breno. Nunca mais foi visto.

Em maio do mesmo ano, a militante Inês Etienne Romeu, depois de ser barbaramente torturada em São Paulo, foi levada para a Casa da Morte, em Petrópolis (RJ). Lá escutou do sargento do Exército Ubirajara Ribeiro de Souza detalhes sobre como Beto fora assassinado naquele calabouço: tiro na cabeça.

O carrasco conhecera Beto quando ambos jogavam basquete em Belo Horizonte, no início dos anos 1960. Confidenciou a Inês, também mineira: "Seu amigo esteve aqui".
Essa é a frase que a jornalista Cristina Chacel, 53, pinçou para o título do livro que resgata agora a história de Breno, que foi muito amigo e militou com Dilma Rousseff contra a ditadura militar.

Dilma fala no livro: "Para mim, ele mandou ler 'Acumulação Primitiva', que é talvez um dos capítulos em que o Marx tenta ser historiador no sentido científico da palavra. Foi assim que eu me iniciei no marxismo".

"Depois ele dava os livros de Lênin. A gente lia 'Duas Táticas da Social Democracia na Revolução Democrática', 'Um Passo à Frente, Dois Passos Atrás', 'O Estado e a Revolução'. Eu li tudo de Lênin com ele, tudo, sem exceção."

O depoimento foi colhido quando ela ainda era candidata à Presidência. Dilma contou que Beto esteve em sua festa de 15 anos, falou da militância conjunta, das discussões políticas e cantarolou músicas de Paulo Vanzolini que tinha aprendido com ele.

Recordou que foi com Beto que passou a adorar comer pato com laranja. O amigo tinha descoberto, na rua Barata Ribeiro, um restaurante que fazia o prato. "A gente deixava de comer uma das refeições, o almoço ou o jantar, por três dias, pra poder comer o pato.

Juntava o meu dinheiro com o dele e dava um pato que a gente dividia", revela Dilma.
Chacel relata que Dilma chorou no depoimento quando surgiu o tema do assassinato de Breno. "Ela usou o lenço, se emocionou. Porque é uma história de se emocionar mesmo. Ela foi muito amiga dele. Estiveram juntos o tempo inteiro politicamente, além da amizade. Nas frações e fusões das organizações estiveram sempre juntos", afirma a autora em à Folha.

Para fazer o livro, a jornalista ouviu durante três anos cerca de 60 pessoas.

"Conto a vida de um jovem estudante de Belo Horizonte que tinha ideais socialistas. Ele foi preso e condenado à revelia por pixar muro. Foragido, viveu os seus últimos anos em severa clandestinidade", resume Chacel.

"Foi empurrado para a condição de inimigo de Estado. E por esse Estado foi sequestrado e desaparecido. É um retrato de uma geração."

Ela afirma que a falta de registros oficiais foi uma das suas principais dificuldades: "É uma história que está no subterrâneo, não tem documentação. Por isso privilegio muito a polifonia e a historia oral".

VÍNCULOS

Ouvindo depoimentos dos amigos e companheiros de militância de Beto, Chacel diz que sentiu entre eles "um vínculo inquebrantável. Há uma relação de cumplicidade, por serem testemunhas, vítimas e protagonistas de um tempo".

"São histórias doídas, mas enfrentadas. Lembranças de um afeto especialíssimo por esse personagem Carlos Alberto, que era espartano e severíssimo com ele mesmo, mas, ao mesmo tempo, tinha uma dimensão humana das pessoas. Não esperou que todos se transformassem em soldados da revolução, embora ele estivesse nesse lugar", declara.
Há ainda muito a investigar, constata Chacel. "Não se descobriu o que aconteceu com ele, não se investigou a Casa da Morte", aponta. "Os covardes doutores da tortura criaram essa monstruosidade jurídica chamada desaparecidos políticos."

Chacel descreve o sofrimento da família na busca por notícias. Na casa onde moravam, o quarto de Beto foi mantido arrumado durante anos. A mãe sempre esperou que a chave dele virasse na fechadura.

SEU AMIGO ESTEVE AQUI
AUTORA Cristina Chacel
EDITORA Zahar
QUANTO R$ 42 (232 págs.)
LANÇAMENTO hoje, às 18h, no teatro Eva Herz (av. Paulista, 2.073, tel. 0/xx/11/3170-4059)


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