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Crítica / Drama

Coreano filma difícil relação entre os gêneros

"Hahaha", décimo filme do cineasta Hong Sang-soo sobre os conflitos amorosos, é o primeiro a estrear no Brasil

CÁSSIO STARLING CARLOS CRÍTICO DA FOLHA

O TEMA DAS COMPLICAÇÕES AMOROSAS, REPRESENTADO NUMA DRAMATURGIA EM QUE O VERBO É SOBERANO, FORÇOU UMA IDENTIFICAÇÃO DO CINEMA DESTE SUL-COREANO COM O DO FRANCÊS ÉRIC ROHMER

A risada contida no título "Hahaha" só vai ser escutada depois da última cena, provocação final de um filme ao qual reagimos com sorrisos, mas que definir como comédia requer um tanto quanto de exagero.

O décimo longa do diretor sul-coreano Hong Sang-soo quebra, até que enfim, o ineditismo no circuito comercial brasileiro do trabalho de um dos cineastas mais estimulantes surgidos na categoria "cinema asiático" desde fins dos anos 1990.

À primeira vista, seus filmes se aparentam à família das comédias de Woody Allen ou do brasileiro Domingos de Oliveira, em que as dificuldades de ajustes dos universos masculino e feminino são capturados com uma mistura particular de ironia e afeto.

Por sua vez, o tema das complicações amorosas, reiterado a cada um de seus dez longas e representado numa dramaturgia em que o verbo é soberano, em que a fala pode tanto ser reveladora quanto proliferar equívocos, forçou uma identificação do cinema deste sul-coreano com o do francês Éric Rohmer (1920-2010), diretor de "Conto de Verão" (1996).

A primeira impressão que se tem de "Hahaha" é a de um filme que provoca risos, mas não gargalhadas, no qual os personagens falam o tempo todo, em que as situações são quase sempre cotidianas e banais e em que se veem muitas cenas de bebedeira.

Em meio a isso, vemos alguns caras maduros agindo como jovens tímidos que não conseguem resolver o excesso de tesão, enquanto as mulheres ficam à espera sem entender os motivos para toda aquela complicação.

PROTAGONISTA

O protagonista recorrente nos filmes de Hong é um cineasta, às vezes em crise criativa, outras simplesmente um artista sem obra, como o Jo Munkyung, de "Hahaha".

A princípio, é a fala dele que guia a história sobre o reencontro com Bang Junshik, um antigo colega com quem marcou uma despedida ao decidir ir trabalhar com uma tia sua no Canadá.

Sobre fotos em branco e preto dos dois amigos bêbados, a voz lembra outros fatos, fragmentos de desencontros amorosos vividos tempos antes numa pequena cidade portuária.

À diferença do flashback tradicional, o de "Hahaha" logo cria um desafio quando descobrimos que há duas vozes em cena; portanto, duas memórias e duas histórias.

Nessa pequena astúcia revela-se a complexidade pouco evidente, numa apreensão superficial, do cinema de Hong Sang-soo. Quem conta o quê para quem? E o que se revela nessa flutuação incessante de perspectivas e de sentidos?

A maneira de filmar quase sempre à distância, como um mero observador, sem se intrometer nem estimular identificações de afetos ou pontos de vista, confunde ainda mais o olhar mais desatento.

Nessa simulação de indiferença, revela-se o mais substancial do cinema de Hong Sang-soo. Nele, não se trata de propor quebra-cabeças pseudo-metafísicos ou de ostentar a fama de filme-tese, mas de exigir que usemos a subjetividade.


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