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Diário de Londres

O MAPA DA CULTURA

Reino Unido e escaldante

As lanchonetes da ilha desconhecem geladeira

BERNARDO MELLO FRANCO

A previsão era literalmente sombria: pelos próximos dez anos, Londres não teria verão. O alerta foi feito em meados de junho pelo Met Office, o respeitado órgão oficial de meteorologia do Reino Unido. "Não se preocupe, o verão está chegando... mas talvez você precise esperar até 2023", resumiu o jornal "The Guardian".

Apesar da ironia, o tom dos especialistas era sério. Vários fatores pareciam conspirar contra o Sol, da emissão de gases poluentes a uma mudança nas correntes marítimas do Oceano Atlântico. Estava tudo pronto para o início de uma década fria e chuvosa na terra da rainha. Mas, como ocorre algumas vezes, os fatos teimaram em contrariar as previsões.

Há quase um mês, o Reino Unido vive uma inesperada onda de calor --a mais longa e intensa desde 2006, como a imprensa não se cansa de repetir. Chove muito pouco, e os termômetros roçam quase diariamente os 30 graus. A máxima até aqui foi registrada na última quinta-feira: 34,2 graus. E ainda era o primeiro dia de agosto. Pelo tom das queixas, os britânicos se sentiram como beduínos.

Famosa por outras qualidades, Londres não sabe lidar com o verão. Como ele aparece pouco, ninguém costuma notar. A maioria das lojas só é equipada com calefação, os ônibus são uma fornalha, e as lanchonetes parecem não ter recebido a notícia da invenção da geladeira.

Mesmo nos cafés mais caros, é quase impossível achar uma água ou refrigerante abaixo da temperatura ambiente. O metrô, que no inverno protege do frio, transformou-se em uma estufa em movimento. A administração espalha avisos inúteis: carregue sempre uma garrafa d'água, não embarque se estiver passando mal, evite apertar o botão de alarme. E adianta?

A FILA DO HAMBÚRGUER

Neste calor atípico, poucos programas parecem menos convidativos do que ficar parado numa fila a céu aberto. Mas é o que locais e turistas têm feito na porta das novas hamburguerias de Covent Carden.

As duas casas abriram no intervalo de um dia e a cerca de 300 metros de distância. A primeira foi a Five Guys, filial da cadeia preferida do presidente Barack Obama. A rede caprichou na patriotada. Marcou a inauguração para o dia Quatro de Julho e pendurou uma bandeira dos EUA na porta. No dia 5, foi a vez da nova-iorquina Shake Shack.

Em ambos os casos, a novidade é que atrai multidões, já que o hambúrguer não leva muita vantagem sobre o do McDonald's. Com batata e refrigerante, cada lanche sai em torno de £ 15 (cerca de R$ 45). Na dúvida, é melhor procurar o primeiro "fish and chips".

BOTA-ABAIXO

Enquanto o leste de Londres festeja a reabertura do Parque Olímpico, o oeste da cidade chora o fim de um espaço tradicional de lazer: a Earl's Court Exhibition. Inaugurado em 1937, o pavilhão recebeu uma lista interminável de gigantes do pop: Rolling Stones, Madonna, Queen, Pink Floyd, Morrissey, Iron Maiden, Elton John.

Nos últimos anos, foi esvaziado pela concorrência da O2 Arena. Com a migração dos shows, sobraram os grandes eventos, como a feira do livro. Faltava vencer a especulação imobiliária.

Em julho, o prefeito Boris Johnson ignorou uma campanha organizada por moradores da vizinhança e autorizou a demolição do complexo para dar espaço a 7.500 moradias de luxo. Os protestos vão virar pó, como o velho edifício "art déco".

O MUNDO DE LOWRY

Céu cinza, ar poluído, enormes galpões de tijolos e chaminés. Esta era a paisagem mais comum no Reino Unido da primeira metade do século 20, um cenário bem diferente do glamour londrino.

O cotidiano da sociedade industrial foi o tema preferido de L.S. Lowry (1887-1976), um pintor brilhante e obcecado em retratar a vida da classe trabalhadora britânica. "Eu só lido com a pobreza. Sempre com melancolia", repetia o artista.

A maioria dos quadros, que flertam com o estilo naïf, foi pintada na região de Manchester, onde Lowry nasceu e morreu. Em algumas telas, a monotonia é quebrada por pequenos acontecimentos: a passagem de um circo, um suicídio, um jogo de futebol. Austero, o artista foi o britânico que mais recusou honrarias reais: cinco, incluindo o cobiçado título de "sir".

A mostra fica em cartaz até 20 de outubro, na Tate Britain. O ar condicionado do museu também merece uma medalha.


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