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MEMÓRIAS QUE VIRAM HISTÓRIAS

O barquinho que se tornou "O Barquinho"

Arraial do Cabo, 1961

ROBERTO MENESCAL

COM 14 ANOS, ganhei um material para mergulho. Coisa muito simples, uma máscara de mergulho, um pé de pato e um canudo para respirar na superfície. Como sou capixaba, mesmo morando no Rio de Janeiro, era no Espírito Santo que passava todas as férias.

Fiquei apaixonado pelo mar e pela caça submarina, tornando-me um terrível predador, querendo caçar todos os grandes peixes que via.

Aos 17 anos, comecei em Vitória a tocar violão, e no fim dessas férias, voltando ao Rio com essa novidade, descobri que Nara Leão, minha namoradinha nessa época, também tinha começado a tocar o instrumento em suas férias em Campos do Jordão.

Foi uma maravilha, pois quase todas as noites eu ia a seu apartamento para tocarmos. Sempre aparecia alguém para cantar e tocar com a gente, e assim foi-se armando um grupo que em dois anos começou a compor suas músicas e se tornou o que foi chamado de "a turma da bossa nova".

A turminha da gente de vez em quando ficava chateada comigo, pois várias vezes fugi de entrevistas e mesmo de alguns shows porque tinha pescaria marcada.

Claro que minhas histórias de pescador, comprovadas por fotos, faziam sucesso nos nossos encontros e cada vez mais minhas músicas nasciam do mar.

Um dia em 1961 resolvi levá-los para um passeio de fim de semana. Pegamos um barco alugado em Arraial do Cabo (RJ) e começamos nossa aventura. O dia estava lindíssimo, com águas claras e quentes, e as poucas ondas, apesar de assustarem a moçada, não prejudicaram nosso passeio.

Comecei a mergulhar e a pegar lagostas, badejos e outros peixes, deixando de boca aberta a turma, Nara Leão, Ronaldo Bôscoli, o pessoal do Tamba Trio, algumas das meninas que nos acompanharam e minha futura mulher, Yara.

Levei-os para um lugar mais raso onde todos desajeitadamente fizeram o batismo no fundo do mar. Lá pelas 15h, desligamos o motor e fomos fazer um lanche, deixando que o barco deslizasse à vontade por aquele lindo dia.

Quando fomos ligar o motor para continuarmos o passeio, ele não quis pegar de jeito nenhum, apesar das dezenas de tentativas que fizemos, até acabar a bateria.

Claro que o pavor crescia cada vez que víamos o quanto estávamos longe da ilha. Fiquei tentando acalmar a turma enquanto tentava fazer o motor pegar, girando uma manivela.

Para tentar mostrar que tudo ia correr bem, eu cantarolava junto ao barulho que o motor fazia nessas tentativas de funcionamento.

De repente, perto das 18h, vimos uma grande embarcação de pesca vindo do horizonte em direção a Cabo Frio. Amarramos algumas roupas coloridas aos remos e fizemos sinais para que nos vissem.

Em poucos minutos eles mudaram o rumo. Os pescadores vindo da Bahia nos deram todo o apoio e começaram a nos rebocar em direção ao Arraial do Cabo.

Neste mesmo momento, Bôscoli e eu fizemos de brincadeira o verso: "O barquinho vai, e a tardinha cai", refrão que fomos cantando até nossa chegada ao cais, enfim são e salvos!

No dia seguinte, no apartamento de Nara Leão em frente ao mar de Copacabana, Bôscoli me perguntou: "Beto, como foi aquela melodia que você fez ontem no barco?". Respondi cantando: "O barquinho vai, a tardinha cai".

Ele me disse "não, essa eu me lembro, estou falando daquela quando você tentava fazer o motor pegar". "Ronaldo", falei, "não me lembro exatamente, mas foi uma coisa meio sincopada, igual ao barulho de um motor falhando, tá, tá, tá, tá...".

Então começamos a compor esse que se tornaria nosso maior sucesso, "O Barquinho".


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