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Marcelo Miterhof

Câmbio e desenvolvimentismo

O câmbio mais depreciado é importante, mas abaixo dos R$ 3,50 estimados para o "equilíbrio industrial"

O dólar voltou a ser cotado abaixo dos R$ 2,20. Ainda assim, mirando a inflação de 2014, o Banco Central não deixou de lado os instrumentos usados desde agosto para conter a depreciação acelerada da moeda brasileira.

A revalorização do real põe em destaque a estratégia de crescimento brasileiro da última década. Não à toa, o câmbio foi o foco do 10º Fórum de Economia da FGV-SP, no início do mês, que discutiu como promover o desenvolvimento industrial para que o país consiga dobrar a renda per capita em 15 ou 20 anos.

Na última década, o esforço de inclusão social fez do país um dos principais mercados em expansão do mundo. No entanto, a indústria de transformação tem perdido participação no PIB.

O principal motivo foi a valorização cambial, que prejudica as exportações e incentiva a importação de componentes, peças e partes usados nos bens de consumo duráveis, além de bens intensivos em trabalho.

A questão-chave é como compatibilizar os avanços da demanda e da oferta. Nesse sentido, o debate na FGV-SP foi em torno de distintas visões desenvolvimentistas acerca do papel da indústria e da taxa de câmbio.

O chamado "novo desenvolvimentismo", cujo núcleo formulador está na própria FGV-SP, aponta que países que contam com grandes dotações de recursos naturais costumam ter uma tendência à apreciação cambial.

Os ciclos são determinados pelo balanço de pagamentos. Quando há crise, a economia entra em recessão e a moeda local se desvaloriza violentamente.

Porém, a dotação de recursos naturais permite que as vendas externas se recuperem e valorizem o câmbio. A apreciação continua mesmo quando há déficits correntes porque a manutenção de juros elevados atrai capitais externos para financiá-los enquanto for possível, isto é, até que outra crise se estabeleça.

Tal tendência cria pesados desincentivos à atividade industrial e ao crescimento. O câmbio valorizado tende a direcionar os recursos externos para o consumo de bens importados, em vez de ser usado para financiar o investimento. A indústria de transformação local perde competitividade global, deixando de exportar e, assim, de manter um padrão global de atualização tecnológica.

Assim, o câmbio deve ser administrado para se manter no nível do "equilíbrio industrial", capaz de orientar investimentos para a exportação e levar as empresas locais a usar as melhores técnicas disponíveis.

O problema é que a estratégia sugere uma "parceria" desequilibrada entre capital e trabalho. Há uma aposta no crescimento puxado pelas exportações, mas isso exige grandes sacrifícios em termos de redução da renda real dos trabalhadores e tem resultados duvidosos, em especial num mundo em estagnação.

Além disso, haveria pesados custos na transição para tal regime. Para mitigar os efeitos inflacionários de uma depreciação cambial de cerca de 50% (segundo estimativa do economista José Luis Oreiro, com isso o câmbio atingiria o nível de equilíbrio industrial), o remédio seria o ajuste fiscal, o que agravaria os danos aos trabalhadores ao comprometer o crescimento imediato e ao reduzir a disponibilidade de recursos adicionais para melhorar os serviços públicos.

Outra corrente, que pode ser chamada de social-desenvolvimentismo, cujo núcleo vem da Unicamp e da UFRJ, enfatiza o consumo massivo: o mercado interno e a inclusão social devem continuar sendo os vetores do crescimento.

Evidentemente, a ampliação da presença externa das empresas brasileiras --pelo aumento de sua participação nas exportações mundiais ou via investimentos externos das empresas de capital nacional-- não é necessariamente dicotômica com a ampliação do mercado interno.

Mas a conquista de mercados internacionais não deve ocorrer pela exploração de mão de obra barata. O papel do mercado externo é subsidiário. Visa a conferir sustentabilidade ao balanço de pagamentos e a expor as empresas nacionais à competição global, induzindo o uso de atividades e iniciativas mais nobres --por exemplo, a inovação e a internacionalização-- como forma de obtenção de lucro.

Para tanto, um câmbio mais depreciado é importante, mas bem abaixo do patamar de R$ 3,50, estimado para o "equilíbrio industrial". Nesse caso, uma regra prática é atualmente proveitosa para um ajuste gradual: evitar que o câmbio se valorize.

marcelo.miterhof@gmail.com


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