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Opinião

Banda para superavit primário precisaria ter regras claras

BRÁULIO BORGES ESPECIAL PARA A FOLHA

Em meio a todo o debate acalorado nos últimos meses sobre a condução da política fiscal brasileira, chamou a atenção uma proposta feita por um ex-integrante do atual governo há algumas semanas: uma banda para a meta de superavit primário, entre 1,5% e 2,5% do PIB.

Tal proposta foi relativamente bem recebida por alguns membros do governo, mas também gerou desconfianças no setor privado: quem garante que o resultado primário não ficará ad eternum no piso dessa banda, assim como a inflação tem se situado sistematicamente próxima do teto nos últimos quatro anos?

Trata-se de uma proposta interessante, desde que atrelada a outras condições, de modo a criar uma regra inteligente e bem definida.

Uma sugestão é que esses intervalos para a oscilação do resultado primário estivessem associados a faixas para a variação do PIB, de modo a criar um mecanismo de ajuste automático da política fiscal com relação ao ciclo econômico --com políticas expansionistas quando a economia cresce pouco e contracionistas quando o crescimento é mais forte.

Mas isso ainda é muito genérico. Uma regra do mundo real deve ser, necessariamente, clara e objetiva. Em primeiro lugar, é pertinente questionar: o intervalo de 1,5% a 2,5% do PIB para o resultado primário parece ser razoável?

Em um relatório recente do FMI sobre a economia brasileira, milhares de simulações de cenários feitas pelo Fundo apontaram que um superávit primário no intervalo de 2% a 3,1% do PIB assegura, em 75% a 90% dos casos, um recuo da dívida pública bruta brasileira ao longo dos próximos 15 anos. Um superavit primário de 1% reduz essa probabilidade para 50%.

Com efeito, um piso de superavit primário de 1,5% do PIB parece ser prudente, dado o nível atual de endividamento público brasileiro. Mas o teto certamente pode ser maior do que 2,5% do PIB, sobretudo em momentos de superaquecimento da atividade econômica.

Mas isso traz outro desafio: definir o que é um crescimento forte ou fraco do PIB.

Apelando para o mesmo relatório do FMI citado acima, estimativas apontam que o crescimento potencial brasileiro nos próximos 15 anos é de cerca de 3,3% ao ano, situando-se entre 2,5% e 4% em 75% dos 1.000 cenários traçados. Esse seria um bom ponto de partida para construir essa régua para classificar o crescimento como forte ou fraco.

Com efeito, já é possível vislumbrar um rascunho mais objetivo de uma regra fiscal anticíclica, que valeria ao menos para o futuro próximo (próximos quatro ou cinco anos): quando o crescimento da economia brasileira se situar na faixa de 3% a 4%, o resultado primário cheio, sem nenhum tipo de abatimentos, teria que se situar entre 2,5% e 3% do PIB.

Quando o crescimento for superior a 4%, a meta mínima para o primário seria de 3% do PIB. Quando a economia crescer menos que 3%, o primário poderia se situar entre 1,5% e 2,5% do PIB.

Tal regra, que teria que ser estabelecida formalmente, daria maior clareza aos agentes (Banco Central inclusive) sobre a política fiscal, asseguraria com chance bastante elevada a sustentabilidade intertemporal da dívida brasileira, ajudaria a atenuar as oscilações de crescimento econômico e, ainda, contribuiria para controlar a tentação de praticar maior expansionismo fiscal em anos eleitorais.

Ademais, ao dar maior flexibilidade para a meta fiscal, também teria o efeito benéfico de evitar que o governo tenha que apelar para operações de "contabilidade criativa" para cumprir a meta de resultado primário definida na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO).

Por fim, é importante deixar claro que isso é apenas um esboço de uma proposta, que certamente precisa ser mais bem pensada e lapidada, uma vez que há vários outros aspectos que precisam ser aquilatados (como, por exemplo, o relacionamento entre Tesouro e bancos públicos e a questão das receitas atípicas, dentre outras).

Mas, com a credibilidade da política fiscal brasileira em xeque, o momento atual parece ser bastante oportuno para propor uma mudança como essa.


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