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ONG de bairro é recordista em créditos de nota fiscal
Com R$ 4,3 milhões, Projeto Casulo recebe mais que entidades como AACD
Lei não proíbe estabelecimento de entregar todas notas sem CPF à entidade de sua preferência
Localizado diante de uma favela em vias de urbanização no Real Parque (zona sul da cidade de São Paulo), o Projeto Casulo é a entidade de assistência social recordista de arrecadação de créditos com a Nota Fiscal Paulista.
Um total de R$ 4.309.358 recheou os cofres da organização de janeiro a outubro deste ano.
Em 2012, o Projeto Casulo obteve R$ 1.110.186 de créditos da nota fiscal paulista. Só essa fonte de receita respondeu pela metade do total de recursos captados pela ONG.
Neste ano, o Casulo mais do que quadruplicou esse tipo de ganho.
O surpreendente é que uma ONG de bairro tenha arrecadado notas fiscais em número muito maior do que entidades gigantes e tradicionais, como a Santa Casa de Misericórdia de São Paulo (3ª no ranking de arrecadação), a Fundação Antonio Prudente, que sustenta o Hospital do Câncer (10ª), ou a Associação de Assistência à Criança Deficiente, AACD (16ª).
DOAÇÃO "INDIRETA"
Não é novidade que recursos da NFP possam ser legalmente destinados a ONGs. O consumidor se acostumou a ver urnas para depósito de cupons fiscais sem indicação de CPF espalhadas pelo comércio.
O "pulo do gato" das entidades foi perceber que a lei não exige esse ato de vontade do consumidor.
A lei da Nota Fiscal Paulista não proíbe o estabelecimento de, unilateralmente, entregar todas as notas fiscais sem indicação de CPF à entidade cadastrada de sua preferência.
No caso do Casulo, segundo o próprio relatório de atividades de 2012, as empresas Decathlon, Leroy Merlin, Atacadista Roldão e Shopping Jardim Sul estiveram entre os principais doadores de cupons fiscais para a entidade, mesmo que nenhum consumidor a tenha indicado.
CONSUMIDOR X ONGS
Nos seis anos de vigência da NFP, 3.900 entidades receberam R$ 262 milhões (esse montante é suficiente para comprar 8.200 carros populares). Elas, que faturaram R$ 287 mil em abril de 2009, passaram a engordar seus caixas com um total de R$ 9,9 milhões em julho de 2013.
Na prática, para a pessoa física que declara o seu CPF no caixa, isso resulta em créditos cada vez menores, já que a devolução é feita com base em um rateio, dividindo o imposto devido pelo estabelecimento entre todos os que se candidatam a receber os créditos da NFP.
Ou seja, quanto mais gente participa do rateio, menos cada um receberá.
Valdir Saviolli, coordenador do programa da NFP, admite o problema.
"Estamos monitorando constantemente essas entidades que vêm apresentando crescimento enorme no volume de notas fiscais." Ele concorda que essa prática vem acarretando prejuízos ao consumidor.
A reportagem da Folha tentou, sem sucesso, entrevistar o responsável pela gestão do Projeto Casulo. Enviou e-mail e telefonou. Também foi ao local, onde foi possível ver, debaixo de mesas, sacos de lixo de 50 litros lotados de notas fiscais. (SILVIO CIOFFI E LAURA CAPRIGLIONE)