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Vinicius Torres Freire

Os ricos e o imposto do jatinho

Programas de esquerda disputam com a direita o título da demagogia e falta de sentido

CASO OS DONOS de jatinhos e helicópteros pagassem IPVA sobre suas máquinas voadoras, os governos arrecadariam mais R$ 8 bilhões por ano, o bastante para financiar os gastos de duas universidades como a USP.

A tese foi apresentada ontem nesta Folha por Vladimir Safatle, colunista desta casa, professor de filosofia da USP e pré-candidato do Partido Socialista e Liberdade (PSOL) a governador de São Paulo.

É possível voar mais longe. Por exemplo. Com R$ 8 bilhões cobrados dos donos dos 22 mil jatinhos e helicópteros que "voam livremente pelo Brasil", segundo Safatle, dá para financiar o gasto anual de uma USP e, de troco, três Hospitais das Clínicas da USP, tido como o maior do Brasil.

Melhor ainda, quem sabe, com tal dinheiro seria possível aumentar o gasto com o Bolsa Família em um terço, financiar 18,7 milhões de famílias em vez das 14,1 milhões de agora.

Só que não.

Nada disso faz sentido.

No Brasil, havia menos de 21 mil aeronaves registradas em 2013, segundo a Anac. Cerca de metade eram aviões com motor a pistão, ditos teco-tecos. Jatos e jatinhos eram pouco mais de 1.200, segundo a estatística disponível até 2012. Havia ainda 188 balões, 310 planadores e 3.661 ultraleves, entre outros.

Nem todas as aeronaves são de propriedade particular. Uns 1.200 são aviões agrícolas, aqueles de jogar inseticida na lavoura.

Ainda assim, suponha-se que fosse cobrada a alíquota estadual mais alta de IPVA sobre tudo isso que voa sobre o Brasil, segundo a Anac. Seria possível arrecadar R$ 8 bilhões só se o valor médio das máquinas voadoras fosse de R$ 9 milhões.

Alguns cantores de axé compram jatinhos na faixa de R$ 5 milhões. Megaempresários de consumo conspícuo pagam uns R$ 50 milhões. Mas dá para arrumar teco-tecos de R$ 500 mil a R$ 1 milhão.

É fácil perceber, porém, que não se trata aqui de minúcias de um IPVA aeronáutico.

No mar perverso de iniquidades e opressões do Brasil, qualquer gota de imposto sobre a riqueza revoltante de desigual é um avanço.

Mas também não é esse o caso maior, aqui.

Inúmeros dos emplastros econômicos salvadores de programas ditos de esquerda disputam o prêmio de absurdo ou de demagogia com coisas como o "choque de gestão" da direita, por exemplo.

Quando os dados básicos não estão simplesmente errados, os projetos pecam pela desproporção tristemente ridícula entre meios e fins, pelo desconhecimento da escassez e do básico do Orçamento do país, pela ignorância da teoria mais elementar e consensual sobre tributação ou economia.

O nível da conversa desce. Tributação menos iníqua seria apenas um problema de Robin Hood. O crescimento econômico que minguou passou a ser irrelevante ("não se come PIB", diz a nova demagogia. Sem "PIB", come-se vento). O estouro inepto das contas públicas favorece enfim os ricos.

Depois de uma dúzia de anos de governos de esquerda, os ricos não pagam mais impostos (o grosso da redistribuição de renda foi feita com dívida extra). A política econômica insensata, que nos talha o crescimento, vai desmoralizar por anos a ideia de políticas alternativas sérias e progressistas.

Mas quem liga?


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