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Do fundo do poço

Funcionários que sobreviveram à recuperação judicial da OGPar, ex-OGX, narram como foi a queda e a ressurreição da empresa

SAMANTHA LIMA DO RIO

Billy Pinheiro e Sílvio Vicente deixaram a Petrobras, onde ocupavam cargos de liderança, entre 2008 e 2011, para serem gerentes na OGX. Foram atraídos por salários e desafios, além do glamour e da polêmica que cercava tudo que o empresário Eike Batista fazia. Acabaram vivendo a experiência profissional mais dura de suas vidas.

Eles são 2 dos 140 funcionários da Ogpar, ex-OGX, que sobreviveram aos dias em que a empresa sangrava diante da opinião pública e de investidores e credores irados.

O calvário perdurou de julho de 2013, quando admitiu a inviabilidade econômica das reservas de petróleo, até a aprovação do plano de recuperação judicial, em junho.

A Folha conversou com eles e mais cinco colegas seus sobre essa fase. Em comum, há alívio e orgulho, enquanto torcem pela recuperação.

A PROMESSA

Rafaella Barbosa veio em 2008, logo depois da bem-sucedida estreia da OGX na Bolsa de Valores, para montar a área de recursos humanos --trabalho facilitado pela fama e o caixa forrado da empresa.

"Uma vez, para preencher três vagas, recebi mil currículos. Contratei nove."

O clima era "ótimo", dizem. "As pessoas se sentiam desafiadas", conta Pedro Sério, analista jurídico.

Na área de exploração e produção, promessas ambiciosas guiavam a compra de equipamentos. Para o campo de Tubarão Martelo, veio uma plataforma para produzir 100 mil barris por dia (o campo hoje produz 13% disso).

"A empresa era conduzida por exploradores [o geólogo Paulo Mendonça presidiu-a entre 2009 e 2012], otimistas por definição. A realidade foi se mostrando diferente", diz Vicente, gerente de projeto.

A REVELAÇÃO

A euforia virou apreensão, com a busca pelo caminho de produzir óleo de forma lucrativa, algo que se mostrava improvável desde 2011, segundo investigação da CVM (Comissão de Valores Mobiliários, reguladora do mercado).

De março de 2013, quando declarou à ANP (Agência Nacional do Petróleo) a viabilidade financeira dos campos, e julho, quando se desmentiu, a OGX tentou, segundo processo da CVM, trazer equipamentos que mudassem o cenário. Em vão.

Depois disso, apenas Tubarão Martelo, que ainda não produzia, indicava ser viável --algo bem diferente do que prometiam 54 comunicados emitidos pela OGX até 2012 que apontavam reservas gigantescas e acabaram, por isso, alvo de processo da CVM contra Eike e sete executivos.

Em setembro, o dinheiro da empresa estava no fim. Sem um aporte de US$ 1 bilhão que Eike prometeu mas não fez, ganhou força a ideia da recuperação judicial. A urgência de um plano que se sustentasse de pé deflagrou a corrida desesperada --e descapitalizada-- para tirar óleo de Tubarão Martelo.

"A entrega do pedido de recuperação, no fim de outubro, foi um alívio, porque nos deu um norte", diz Sério.

O CALVÁRIO

Enquanto isso, choviam questionamentos da CVM e de acionistas.

Márcia Mainenti, gerente de relações com investidores, chegou a responder cem e-mails por dia. "Investidores nos xingavam."

O desânimo se instalou entre funcionários. "Amigos perguntavam E aí, já quebrou?'. Eu tentava acalmar a família", diz Barbosa.

Colegas da Petrobras ofereciam a Vicente ajuda para procurar emprego. "Tranquilizei-os e disse que ia ficar."

Já Sério era alvo de curiosidade. "Outros advogados ficavam fascinados com meu relato. Onde mais se vive uma recuperação judicial?."

Com casamento à vista, o analista fiscal Bernardo Duarte procurou emprego. Encontrou na construção civil. "Não podia ficar desempregado."

Rafaella Barbosa se viu obrigada a conduzir a demissão de cem colegas. "Concentramos em um dia, para reduzir o trauma. Foi triste, mas todos esperavam aquilo."

Àquela altura, sem receber, fornecedores deixaram de atender a empresa. Gerente de logística, Pinheiro teve de procurar outros fornecedores. Conseguiu. "Com o dinheiro no fim, Márcia me perguntava O que é necessário manter? O que pode cortar?'"

O RESSURGIMENTO

Tubarão Martelo entrou em produção em 5 de dezembro. Mas a receita com a venda do petróleo só chegaria no fim do mês. "Tive medo de ter de parar a produção por falta de dinheiro", diz Vicente.

A OGX entregou o plano de recuperação judicial à Justiça em fevereiro e conseguiu financiamento de US$ 125 milhões de credores, que se tornariam acionistas. De 50%, Eike passaria a ter menos de 10%, e minoritários, sairiam de quase metade para 5%.

A OGX virou Ogpar. Com 60% menos funcionários, mudou-se. Menor, a nova sede tem aluguel 81% mais barato: R$ 150 mil.

"As baias vazias deprimiam. Hoje, todos estão perto", diz Pinheiro. "Nunca me arrependi de ter vindo."

Em fevereiro, Duarte decidiu voltar. "Sou feliz aqui. E acredito na companhia."

Festinhas mensais de aniversário, suspensas há mais de um ano, foram retomadas.

Com o lucro da Ogpar de R$ 516 milhões no primeiro semestre, funcionários voltam a sonhar com participação nos resultados. "Se não der, vou entender", diz Sério.

Uma vez por mês, o presidente da empresa, Paulo Narcélio, reúne-se com os funcionários para relatar a situação da empresa.

Com carreira em telecomunicações e tecnologia, chegou à empresa em outubro. "Gosto desse desafio."

Em 3 de junho, quando o plano de recuperação judicial foi aprovado por credores, funcionários se abraçaram e saíram para comemorar na Lapa, Centro do Rio. "A Ogpar não se recuperou ainda, mas é viável", diz Pinheiro.

O FUTURO

A empresa agora busca recursos para produzir mais em Tubarão Martelo. Tem outra reserva, na Bacia de Santos, em parceria com a Queiroz Galvão e a Barra Energia.

Deve produzir óleo em 2016. Dos 50 mil barris totais por dia que, um dia, previu produzir, hoje extrai 15 mil.

"Quem ficou é resiliente e movido pelo desafio da virada", disse Vanderli Frare, coordenadora do CBA em gestão de pessoas do Ibmec-DF. "A empresa precisará manter o diálogo e a transparência, pois não terá outra chance."


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