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Para Kofi Annan, EUA estão certos em não invadir Síria

Ex-secretário-geral da ONU elogia cautela americana em entrevista à Folha

Líder ganense, que lança suas memórias, diz que necessidade de reformas nas Nações Unidas é "óbvia"

CASSIANO ELEK MACHADO DE SÃO PAULO

Criticado dentro e fora dos Estados Unidos por sua postura cautelosa diante do conflito sírio, o presidente Barack Obama tem um aliado de peso nesta questão.

"Obama é sábio de não enviar suas tropas", diz o ex-secretário-geral da ONU e ganhador do Nobel da Paz Kofi Annan, 75, em entrevista por telefone à Folha, ontem.

"É muito mais difícil ficar parado do que agir nesta situação. Alguns querem ação, mas ação para quê? Se for para tentar mudar o quadro político, vale. Se for no sentido de intervenção militar, não vai ajudar", expressa Annan.

O líder ganense falou à Folha em razão do lançamento no Brasil de seu livro de memórias, "Intervenções" (Companhia das Letras). Nele, afirma que os conflitos internos na Síria fazem os do Iraque pós-2003 "parecerem brincadeira de criança".

As alusões à Síria não são fortuitas. Ao longos das mais de 400 páginas de sua autobiografia ele trata de inúmeros conflitos que enfrentou ao longo de dez anos à frente da ONU (1997-2006), mas poucos ele considera tão insolúveis como este.

"Houve um engano por parte de muitos governos. Acharam que o conflito na Síria seria curto e que poderia ser resolvido da mesma maneira como foi feito na Líbia. Mas eu avisei que a Síria não era a Líbia. Iria explodir."

Annan conhece o caso de perto. Quando terminava o livro, no início do ano passado, em sua casa em Genebra, na Suíça, recebeu um telefonema do atual comandante da ONU, Ban Ki-moon, pedindo que ele fosse à região mediar conflitos. Depois de alguns meses, Annan desistiu.

"O que é necessário na Síria é um esforço coletivo e organizado do Conselho de Segurança, sobretudo dos membros permanentes, em conjunto, para pressionar o país a resolver o conflito."

Tema popular para a diplomacia brasileira, a reforma do Conselho da Segurança da ONU é vista por ele como "cada vez mais prioritária".

"A necessidade de reforma é óbvia", diz ele, de seu escritório, na Suíça, com o vozeirão grave e pausado que sempre marcou seus discursos.

"O caráter permanente destes membros, como bem sabemos, foi decidido em 1945. O mundo se transformou desde então. A ONU tem de mudar com o mundo."

Ele menciona como as maiores distorções a ausência da Índia ("cujas decisões afetam mais de 1 bilhão de pessoas"), do Japão ("o segundo maior contribuinte da ONU) e o fato de dois continentes, América Latina e África, estarem de fora.

E o Brasil? "Tem possibilidades reais", diz Annan, que só cita o país uma vez no livro, justamente sobre este tema. Quem aparece com destaque, às vezes surpreendentemente positivos, é George W. Bush, com quem Annan teve duras brigas depois da Guerra do Iraque.

"Obviamente tivemos muitas diferenças políticas e como líder ele fez seus erros, como eu fiz os meus", comenta. "Mas é fato também que ele deu contribuições, por exemplo na luta contra o HIV e no combate à pobreza."

TEMPOS DIFÍCEIS

Annan, que trabalhou na ONU por mais de 40 anos (começou em 1962), diz que durante a Guerra no Iraque ouviu comentários de que a instituição se tornaria irrelevante. Ele refuta com veemência.

"A ONU reflete a sociedade de seu tempo. Quando as coisas vão bem, a ONU se fortalece. Em tempos difíceis, os países se escondem em suas fronteiras." E como são nossos tempos? "Muito difíceis."

Membro de conselhos de diversas fundações, como a ONG The Elders, onde milita Fernando Henrique Cardoso, Annan tem priorizado atividades na África. "A responsabilidade dos problemas da África não é da colonização. É dos próprios africanos."


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