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Novo presidente do Irã acena ao Ocidente
Hasan Rowhani, tido como moderado, promete mais transparência no programa nuclear, mas pretende mantê-lo
Apesar disso, ele deixou claro que apoia hostilidade a Israel e regime ditatorial de Bashar al-Assad na Síria
O presidente eleito do Irã, o centrista Hasan Rowhani, prometeu ontem mais transparência no programa nuclear e se disse disposto a melhorar laços com o Ocidente, acenando até para possível diálogo com os EUA.
Na primeira entrevista coletiva desde a eleição de sexta-feira, Rowhani delineou planos que confirmam, ao menos parcialmente, sua reputação de moderado.
"Nosso programa nuclear é totalmente transparente, mas estamos prontos para mostrar ainda mais transparência", disse Rowhani, calmo e sorridente, diante de um auditório de Teerã abarrotado de jornalistas.
"Onde quer que a confiança tenha sido abalada, trabalharemos para restaurá-la", afirmou o clérigo, que foi chefe negociador nuclear até 2005, quando Teerã mantinha elos cordiais com o Ocidente.
Decisões sobre o programa nuclear cabem ao líder supremo, aiatolá Ali Khamenei, mas o presidente tem margem para assessorá-lo e dar o tom das negociações.
Especula-se que Rowhani esteja disposto a aceitar reduzir o grau de enriquecimento de urânio e facilitar o acesso dos inspetores da AIEA, a agência nuclear da ONU, a instalações atômicas.
Milhões de iranianos votaram no clérigo em razão da promessa de que uma relação menos tensa com o Ocidente ajudaria a aliviar sanções econômicas que geram desemprego e inflação.
Ontem, a AIEA afirmou que o acirramento das sanções não conseguiu frear o programa nuclear que Teerã diz ser voltado para a produção de remédios e energia.
DIREITO NUCLEAR
Apesar da retórica apaziguadora, Rowhani deixou claro que a lista de eventuais concessões não inclui a suspensão da atividade atômica.
Questionado sobre eventuais conversas diretas com os EUA, disse estar disposto a aceitá-las desde que Washington reconheça "os direitos da nação iraniana, inclusive o direito nuclear".
"Os americanos precisam prometer que não irão mais interferir nos temas internos do Irã", disse Rowhani, numa aparente referência ao golpe de Estado pró-EUA em 1953 e ao apoio à ditadura secular do xá Mohamed Reza Pahlevi nos anos 70.
"Há uma ferida antiga que pode ser tratada com paciência", afirmou o presidente eleito, que se comprometeu a não aumentar tensões.
A sessão de perguntas corroborou o discurso conciliador apresentado durante a campanha, na qual Rowhani entrou como azarão, mas venceu no primeiro turno.
Rowhani se absteve de mencionar a promessa de liberdades morais e políticas que lhe rendeu o voto de jovens e liberais. Na campanha, ele foi até o limite do aceitável no apertado espectro da política sob Estado teocrático.
Ele defendeu o fim das restrições a jornalistas e artistas e falou em retirar filtros à internet. Num comício final, criticou a obsessão da polícia moral pelo véu obrigatório para as mulheres.
"O tema é sensível. Sua estratégia consiste agora em não mencioná-lo e ao mesmo tempo pegar leve no controle de rua", diz Hamid, 25, que participou da campanha.
ALINHAMENTO
Rowhani se dispõe a romper com a agenda dominante no Irã, mas deixou claro que endossa a hostilidade a Israel e o apoio ao regime sírio contra rebeldes.
O presidente também esbarra em sua dependência dos clérigos e militares onipresentes no país.
"Ele é direto e pragmático, mas intensamente ligado à proteção do Irã [e] da Revolução Islâmica", escreveu no jornal "Telegraph" o ex-chanceler britânico Jack Straw, que tratou com Rowhani em conversas nucleares até 2005.