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Clóvis Rossi
G20 vem aí, nada de pânico
Brasil gostaria de que os EUA fossem cautelosos ao retirar estímulos, mas não quer parecer desesperado
O governo brasileiro chega para a cúpula do G20, quinta e sexta-feira em São Petersburgo, com uma prece em voz baixa para que os Estados Unidos sejam extremamente cautelosos ao implementar a retirada dos estímulos monetários que adotaram na crise e foram uma injeção de dinheiro na veia da economia.
Por que a prece? O simples anúncio de que os estímulos acabariam, feito há três meses, provocou o que o ministro Guido Mantega batizou recentemente de "minicrise", uma desagradável turbulência cambial. É fácil deduzir que a implementação do que foi anunciado poderia forçar a retirada do "mini" e deixar só crise.
Por que em voz baixa? Para evitar dar a impressão de que o governo brasileiro está em pânico.
O Brasil não estará sozinho na oração por uma retirada organizada dos estímulos norte-americanos.
A questão passou a ser central para a oitava cúpula do grupo que reúne as principais economias do planeta, responsáveis por quase 90% de tudo o que se produz no mundo.
É o que deixa claro Ksenia Yudaeva, a representante pessoal do presidente anfitrião, o russo Vladimir Putin: "O que pode ser o problema de amanhã é a ausência de mecanismos de segurança adequados em caso de problemas com a saída de uma política econômica não convencional. A história nos mostra que, quando os Estados Unidos e, em alguns casos, a Alemanha e os países desenvolvidos apertaram suas políticas, isso levou frequentemente a estresse financeiro ou crises".
Yudaeva inclui entre as crises o contágio da crise asiática de 1997/98 no Brasil (e na Rússia).
Ela tem razão: quando os juros passam a ser atraentes nos países ricos, o dinheiro que circula pelo mundo vai para eles, mais seguros, levando à desvalorização das moedas dos emergentes, como está ocorrendo agora.
Nos oito primeiros meses do ano, com ênfase nos três últimos, o dólar se valorizou 63% ante o real.
É por isso que Zhu Guangyao, vice-ministro chinês de Finanças, pede consultas dos EUA com seus parceiros ao retirar os estímulos, "para evitar riscos desnecessários para a economia global e desordem nos mercados cambiais".
Quais as chances dessa coordenação ser adotada na cúpula do G20? Baixa. "O G20 pode fazer muito pouco além de intensificar a percepção de que os países desenvolvidos têm que ser cuidadosos", ouviu a Folha na delegação brasileira que participará da cúpula de São Petersburgo.
Seria o que o jargão diplomático batiza de "peer pressure" (pressão dos parceiros, em tradução livre).
O momento não é exatamente o ideal para que os Estados Unidos atendam à pressão. O país está em duplo curso de colisão com o anfitrião, a Rússia --primeiro pelo asilo dado a Edward Snowden, que revelou a megaespionagem americana, e agora pela resistência de Putin em aceitar a tese de que o ditador sírio Bashar al-Assad usou armas químicas e deve ser punido por isso.
Por mais que o G20 tenha a economia como foco, reuniões de líderes não conseguem escapar de temas políticos.