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Jornalistas apontam escalada no controle da imprensa na China

Profissionais começam a prestar 'vestibular' de marxismo e obediência ao Partido Comunista

Repórteres veem falta de credibilidade e maior autocensura; liderança do PC quer mostrar sua força, afirma professor

MARCELO NINIO DE PEQUIM

"Devemos aprender com as conquistas políticas e culturais da humanidade, mas jamais copiar o sistema político do Ocidente nem adotar o regime multipartidário e a separação entre poderes."

Verdadeiro ou falso?

Questões assim fazem parte do exame que os jornalistas chineses começaram a prestar nesta semana --um "vestibular" de marxismo, patriotismo e, sobretudo, obediência ao Partido Comunista.

No último ano, milhares de jornalistas passaram por sessões de treinamento, sob a tutela do departamento de propaganda chinês. Trata-se de mera formalidade doutrinária --não é preciso ajuda extra para saber a resposta esperada (na questão acima, obviamente, é "verdadeiro").

Profissionais da imprensa chinesa contam que a prova faz parte da escalada no controle da mídia desde a chegada ao poder da nova liderança, há pouco mais de um ano.

"O governo quer mostrar seus músculos", diz Doug Young, professor de jornalismo da universidade Fudan.

Mais reportagens têm sido censuradas, e há novas restrições, como a necessidade de permissão para encontrar estrangeiros e empresários.

Todos os jornalistas ouvidos pela Folha falaram sob anonimato. São profissionais da mídia estatal, que trabalham sob pressão e estão proibidos de falar com um repórter estrangeiro. Segundo eles, o arrocho aumentou a autocensura dos jornalistas.

Além das regras óbvias, como não atacar o PC, o que pode ser dito nem sempre está claro. "O repórter muitas vezes só sabe que cruzou a linha quando o editor barra a reportagem", diz a repórter sênior de um jornal nacional.

"Já tive de me esconder das autoridades de uma província porque a ordem era não noticiar uma rebelião de pescadores. Mas eu quis ficar para ver, mesmo sabendo que a matéria não sairia", conta.

Depois de dez anos de trabalho na TV estatal (CCTV), o repórter e produtor Wang Qinglei usou as redes sociais para desabafar sobre a "atmosfera sufocante" no canal.

A ousadia lhe custou o emprego, e ele foi ao ataque: em carta de despedida, lamentou que os jornalistas da CCTV tenham se tornado "palhaços manipulados". "Ter prédio novo em folha e correspondentes no mundo não significa termos tudo. O que lentamente perdemos foi nossa credibilidade", dizia a carta, que a censura deletou das redes.

A maioria dos jornalistas se conforma. "Quando me formei, há seis anos, eu tinha um ideal. Hoje é só um trabalho", diz uma repórter de um jornal de Pequim, de 31 anos.

Para ela, emprego estável e mordomias como viagens e presentes justificam a resignação: "Costumamos dizer que ser jornalista na China é como dançar acorrentado".

BRECHAS

O controle do Estado não significa que a mídia chinesa seja monolítica. Na linha de frente estão os veículos financiados pelo governo e que agem como porta-vozes oficiais, como a agência Xinhua e o jornal "Diário do Povo".

Mas há outros mais liberais, em geral de governos locais, que precisam gerar seus recursos. Para ser competitivos, abrem brechas ao jornalismo com credibilidade.

Uma greve de jornalistas desse grupo irritou o governo no início de 2013 e teria sido um dos motivos que levaram o PC a endurecer o controle.

Funcionários do semanário "Southern Weekend" e ativistas protestaram em Guangzhou após censores transformarem um editorial por direitos constitucionais num artigo com elogios ao PC. "Definitivamente o controle aumentou depois disso", confirma um jornalista da revista.

No ranking de liberdade de imprensa da Repórteres sem Fronteiras, a China é a 173ª entre 179 países. Ademais, está entre os três países com mais jornalistas presos (32).


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